Ela guia todas as rodas

Claudia Woods, CEO do site de carros Webmotors, inovou em banco, na L'Oréal e agora nas rodas: ela adora skate

Luiza Souto Da Universa Marcelo Justo/Universa

Ela formou-se em Economia nos Estados Unidos, foi chamada pela L'Oréal para implantar a área digital da empresa, criou, no Brasil, a abertura de contas bancárias online, em 2017, quando trabalhava no Banco Original e, sim, tem mais: como CEO recém-chegada ao Webmotors, o maior site de compra e venda de carros do país, bolou outra inovação: uma ferramenta que permite a negociação de maneira mais segura, já que verifica a idoneidade dos clientes, vistoria o veículo e intermedeia o pagamento, por meio de uma conta bancária da própria empresa. 

Claudia Woods, de 43 anos, filha de brasileira e americano, está no Webmotors desde maio (a empresa foi aberta em 1995 e conta com mais de 30 milhões de visitas mensais), e, além de criar por lá um ambiente que ela chama de "girl power insano" -- a saber, ela reúne as funcionárias de todo o país para conversar sobre assédio --, pretende fazer com que o site cresça 50% a cada ano.

Claudia anda de skate - às vezes, vai trabalhar assim - surfa, é da bike, adora futebol e carro também. 

Sim, essa mulher existe. E está no comando da coisa toda.


Quais foram seus grandes goals como CEO do Webmotors?
Minha função na empresa é oferecer, para quem quer comprar e vender, o negócio com as características mais próximas possíveis do que ela procura. Para melhorar essa mecânica, acabei de lançar o Autopago, que é um aplicativo pioneiro nessa área. Com ele, os envolvidos na negociação conseguem verificar se o veículo foi roubado, batido ou está com problema na documentação. Como exemplo do nível de criatividade nas fraudes, recentemente, uma pessoa mandou documentos com foto do Chico Buarque. Essa ferramenta foi meu primeiro e grande movimento como CEO na empresa. Outro exemplo: logo que cheguei, a empresa lançou um outro aplicativo, uma espécie de Tinder dos carros, que conecta informações de estoque dos lojistas e possíveis clientes num único cadastro. Com essa ferramenta, consigo saber quem é a pessoa que quer comprar, quanto está disposta a pagar, qual modelo ela quer e se tudo isso está disponível.

O que você precisa entregar num futuro próximo?
Nesse pouquíssimo tempo como CEO, seis meses, peguei uma empresa que vinha crescendo 40% ao ano e mantive o mesmo ritmo de crescimento. Quando há mudança de gestão, normalmente rola um período de adaptação em que o resultado financeiro oscila, mas considero que meu sucesso foi entrar como se nada tivesse acontecido. 

Para o futuro, minha meta é um crescimento de 50% ao ano.

Você é formada em economia. Como entrou no mercado digital?
Quando me formei, aos 20 anos, comecei a trabalhar em uma consultoria americana, no Maine, contratada por grandes marcas como a Coca-Cola, para entender o que os concorrentes deles estavam fazendo. Eu era responsável pela América Latina toda. No meio desse processo, em 1997, começou o boom de startups e montei um site que conectava pais e filhos às escolas. O negócio durou dois anos e eu fiquei com uma coceirinha pelo ramo. Nessa época, um amigo estava montando o iBest, que era um provedor gratuito, e me convidou para trabalhar com ele. Em duas semanas me mudei para a casa da minha avó, no Rio de Janeiro, e comecei a erguer a estrutura de mídia do site e o modelo de negócio. Foram quase cinco anos de construção.

Depois disso você passou por empresas como L'Oréal, ClikOn, virou sócia da Predicta, depois, CEO na Netmovies e diretora de marketing do Walmart.com. O que foi determinante para chegar a esses cargos?
Em 2004, fui estudar no Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Também fiz um programa da Harvard Business School voltado para empreendedores na construção de plataformas digitais, o Building Ventures in Latin America. Esse foi o momento “game changer” (desafiador, numa tradução livre) da minha vida, porque ali, participei de uma competição que a L’Oréal promove no mundo inteiro. Eu e dois amigos apresentamos para o presidente global da marca uma plataforma em que um gerente real da empresa tinha que administrar um produto online e, todos os dias, tomar uma decisão em relação a ele. Ficamos em primeiro lugar. A L’Oréal então me convidou para montar a parte digital da empresa. Depois disso, em menos de um ano, fui para a Predicta. Em seguida, para ClickOn, Netmovies e Walmart.com, em que sempre trabalhei na construção de plataformas digitais. É muito difícil um profissional ter a experiência que eu tenho.

Você foi diretora do Banco Original e, no posto, comprou uma briga com o Banco Central, para conseguir implantar a abertura de contas online. Processo histórico, não?
Assumi o banco em 2014, primeiro como superintendente executiva, quando nenhum banco tinha aberturas de conta online, e fiquei dois anos cuidando do mobile banking, internet banking e atendimento ao cliente. Mas a grande conquista veio em 2017. Até então, o mercado financeiro entendia que só se podia abrir uma conta com interação humana, ou seja, de forma presencial.

Quando lançamos a abertura online, o Banco Central nos mandou parar por três semanas. Fomos lá e provamos que esse processo é mais seguro que o humano. Hoje, todos os bancos abrem conta 100% digital.

Apesar de todos esses feitos, enfrenta machismo?
Quando cheguei no Original, usava blusa de gola, zero maquiagem e calça comprida, até que um dia fui de saia e uma pessoa me falou: “Volta amanhã de calça porque não estou conseguindo me concentrar”. Voltei com uma saia mais curta e disse: “Vamos continuar aquela conversa?”. Isso despertou em mim um negócio “girl power” insano e, desde que cheguei no Webmotors, me encontro com todas as mulheres que trabalham na empresa, e também no Santander (dona de 70% do site) fazendo um coaching, falando sobre assédio abertamente, perguntando quais os momentos em que elas não se sentem bem. Já conversei com cerca de 100 funcionárias.

Quais são os seus principais feitos como chefe?
Um deles é ser próxima dos funcionários e conseguir movê-los com minha energia.

Dou zero importância para hierarquia, detesto que me tratem como chefe. Isso faz com que as pessoas se sintam mais reconhecidas, além de despertar a criatividade nelas, porque se sentem ouvidas. Outro: não tem nada que aconteça nessa empresa que eu não saiba.

Quais erros você cometeu como chefe?
Faltava um carinho quando eu dava feedback às pessoas, saber quem estava ali na minha frente e que a pessoa vai para a casa arrasada ao receber um retorno negativo. O outro erro foi não enxergar melhor os atributos dos profissionais. Muitas vezes, eles não atuam direito porque estão nas posições erradas, ou recebendo um mau direcionamento. 

Com quem uma chefe mulher normalmente pode contar dentro da empresa?
O cargo de CEO, por definição, é muito solitário, porque, no final das contas, você precisa de todo mundo e não é par de ninguém, mas tento tornar a relação horizontal, contar com todos.

Na sua experiência, mostrar fraquezas ajuda ou atrapalha uma mulher?
Ajuda. A gente é mais explosiva, grita, e isso, somado ao evento de ir para o banheiro chorar, é ruim. Sempre vai ter alguém para dizer “ela está na TPM”. Acho que o bacana é assumir a fraqueza, o erro e pedir ajuda. Se expor, dessa maneira, te aproxima das pessoas.

Você está casada há 12 anos e tem um filho de 10. Qual a sua estratégia para cuidar bem da família, ter hobbies, namorar e estudar?
É ter uma válvula de escape. No meu caso, é correr. Vou quase todo dia. Adoro surfar, tento viajar uma vez por ano para esquiar, ando de skate e adoro futebol. E me permito levantar de uma reunião para sair para jantar com meu marido ou estudar com meu filho. Mas faça isso com um plano antes.

Na sua área, predominantemente masculina, quais as vantagens que uma chefe mulher leva?
Ser uma mulher nesse meio é um desafio porque você tem que provar que sabe o que está fazendo para ganhar o respeito. E daí, quando fazemos isso, nos tornamos exemplo para as outras, principalmente aquelas que estão se formando. Ter uma mulher presidente muda a forma como as funcionárias vão conduzir a carreira. Eu curto muito carro, aprecio design e conheço todos os modelos. E o meu diferencial é que sou super especialista no que faço, que é tornar o site o melhor destino para quem está buscando determinado produto; hoje em dia, vender ou comprar um carro. 

Você é bonita. Beleza ajuda nos negócios, certo?
Às vezes, atrapalha, por uma questão de preconceito: o cliente te vê como uma menininha bonitinha e sem conteúdo. Toda vez que sinto isso, me apoio no meu conteúdo.

Mas a beleza ajuda quando entro numa loja de carro, e o dono, por ainda não estar num mundo 100% evoluído, me dá mais atenção. Aproveito essa disponibilidade e engato numa conversa que deixa bem claro que não estou ali para tomar cafezinho.

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