Topo

"Nós também": prostitutas protestam na França contra violência sexual

Thomas Samson/AFP
Imagem: Thomas Samson/AFP

Da RFI

27/11/2018 20h37

Pouco mais de um ano após a revelação dos escândalos sexuais que desencadearam o movimento #MeToo, as prostitutas na França estimam terem sido excluídas do debate sobre a violência feita contra as mulheres. Alegando que também são vítimas de abusos, as trabalhadoras do sexo pedem para serem incluídas em movimentos feministas. 

A indignação das prostitutas começou a ganhar voz e se tornar visível no fim de semana passado, durante uma manifestação em Paris contra a violência visando as mulheres. O evento, que reuniu 80 associações feministas, contava no cortejo com organizações como a Strass, entidade que se denomina como Sindicato do Trabalho Sexual. Carregando cartazes com os dizeres #Nousaussi (Nós também), o grupo chamava a atenção para a situação das pessoas que vivem da prostituição, “as primeiras visadas pela violência”, segundo o Strass.

Veja também

“Quando você é prostituta, é como se você não fosse mais uma mulher pela qual se merece lutar”, explica a militante Anne Darbes, 52 anos. Ela mesma diz ter abandonado a prostituição após ter sido vítima de uma agressão violenta por parte de um cliente.

“As prostitutas não são consideradas como iguais aos demais na nossa sociedade. São vistas como detritos”, se irrita Mickey Meji, prostituta sul-africana e militante. Ela faz parte do grupo de trabalhadoras do sexo vindas de diferentes países, a convite da associação francesa Mouvement du Nid (Movimento do Ninho) para denunciar em Paris a violência feita contra prostitutas.

Prostitutas imigrantes clandestinas são as mais visadas

Segundo Florence Lévy, pesquisadora do Instituto Sciences Po e que trabalha sobre o tema, a sociedade opõe a imagem da “mulher honesta abusada” àquelas que se prostituem. “Há agressores que se especializaram no ataque de prostitutas”, relata, lembrando que as mais visadas são as imigrantes clandestinas. “É um acúmulo de vulnerabilidades”, analisa.

Thierry Schaffauser, porta-voz do Strass, critica a intolerância das autoridades, que torna ainda mais difícil o debate. “Atualmente, a única resposta política proposta para lutar contra a violência visando os trabalhadores do sexo é a saída da prostituição. Mas isso não resolve o problema”, analisa.

Tema divide feministas

Algumas militantes feministas defendem que a prostituição representa, por sua natureza, uma violência contra as mulheres. Um argumento que acaba dividindo o debate.

“Claro que eu apoio um movimento como o #Metoo”, declarou a prostituta Nina. “Mas quando as feministas partem do princípio que a prostituição já é um estupro, não vejo como podemos ser levadas a sério quando somos realmente agredidas”, explica. “As trabalhadoras do sexo devem brigar para serem ouvidas”, completou.

“É muito fácil, em uma sociedade sexista patriarcal aproveitar de todas essas precariedades para excluir essas mulheres e seus testemunhos, inclusive nos movimentos políticos que deveriam permitir a conquista da igualdade”, ponderou Raphaëlle Rémy-Leleu, porta-voz do movimento Osez le féminisme (Ouse o feminismo), que luta pela abolição da prostituição.

A prostituição não é proibida na França. No entanto, uma lei adotada em 2016 pune os clientes, com multas de cerca de € 1.500 (R$ 6.500) e que podem chegar a € 3.750 (mais de R$ 16.000) em caso de reincidência.

“Somos obrigados a trabalhar na clandestinidade procurarando espaços escondidos para realizarmos nosso trabalho porque os clientes têm medo de serem pegos pela polícia", disse à RFI Juan Florian, outro porta-voz da Strass. Segundo ele, percebendo a vulnerabilidade das garotas e garotos de programa com a nova lei, quadrilhas passaram a se formar com o objetivo de saquear e violentar os profissionais do sexo. Para facilitar a organização dos roubos, muitos ainda se fazem passar por falsos clientes.