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Grávida de oito meses, ela perdeu o marido: "Desejei não ter mais filho"

Bárbara Therrie

Colaboração para Universa

05/07/2019 04h00

Após cinco anos tentando engravidar, a assistente de vendas Marília Oliveira, 35, e o marido, José Roberto, que tinha 40, celebravam o oitavo mês de gestação de Manuel quando uma doença causou uma reviravolta na vida da família. Vítima de um edema pulmonar, José Roberto sofreu nove paradas cardíacas e faleceu um mês antes do filho nascer. Nesse depoimento, Marília conta como foi viver o luto do marido e a missão de ser mãe.

"Uma semana depois de voltar das férias, em setembro de 2017, eu descobri que estava grávida. Fiz o teste de farmácia e enviei a foto para o meu marido com a legenda: 'Oi, papai'. Ficamos felizes, estávamos tentando engravidar havia cinco anos.

Não sei se estava no inconsciente dele, mas o tempo que ele acompanhou a gestação, cerca de sete meses, curtiu mais do que eu. Ele fazia planos, dizia que seria parceiro e participativo. O sonho dele era ser pai. Ele ficou eufórico quando descobrimos que teríamos um menino, escolheu o nome Manuel em homenagem ao avô paterno.

Eu estava no fim da gravidez, no oitavo mês, quando meu marido teve febre, dor de cabeça, ficou com o corpo inchado. Esse mal-estar durou uma semana até que ele foi ao hospital em uma segunda-feira achando que era uma sinusite. Ele me ligou para falar que estava bem, mas que ia ter que ficar internado para fazer uma bateria de exames e no dia seguinte teria alta. Ele pediu para a sobrinha dele passar a noite comigo, eu fiquei preocupada e mandei uma mensagem dizendo que queria estar ao lado dele. Ele respondeu: 'Eu também queria, mas preciso proteger você e o nosso filho'. Foi a última vez que nos falamos.

No dia seguinte, minha cunhada foi me buscar no trabalho e falou que ele tinha piorado. Os médicos suspeitavam que ele tinha contraído a gripe H1N1. Eu não pude visitá-lo pelo risco de contaminação. Na madrugada de terça para quarta, no dia 11 de abril de 2018, ele sofreu nove paradas cardíacas e faleceu. Eu não tive nenhum pressentimento, dormi bem, mas quando acordei, fui invadida por um vazio, uma sensação ruim. Eu não sabia o que estava acontecendo, todos tentavam me poupar por causa da gestação, mas eu imaginava que algo grave tinha acontecido com ele.

Desejei não estar mais grávida quando soube da morte do meu marido

Meu cunhado me levou para a casa do meu sogro alegando que ele me levaria para a consulta do pré-natal que estava agendada para mais tarde. Quando cheguei lá, vi um monte de parentes do José Roberto, todos com a cara assustada. A médica da família me abraçou e disse: "Marília, o Beto não resistiu". Eu caí no sofá e comecei a chorar desesperadamente. Naquele momento, em que eu soube da morte do meu marido, eu desejei não estar mais grávida, não queria mais ter meu filho. Eu me culpei, achei que se não estivesse grávida, eu poderia ter acompanhado o José Roberto e evitado aquela tragédia. A causa da morte foi edema pulmonar.

Na despedida dele, no velório, eu perguntava por que ele tinha me abandonado, achava que minha vida tinha acabado. Nesse último mês da gravidez, eu mudei para a casa dos meus sogros, segui à risca tudo o que a obstetra orientou, fiz todos os exames, ultrassons, eu me importava com a saúde do Manuel, mas não existia mais o elo entre mãe e filho.

Me transformei com o nascimento do Manuel, ele renovou tudo o que estava destruído em mim

Eu só me descobri mãe e o amor por ele floresceu quando ele nasceu, no dia 5 de maio de 2018. Ele foi levado para a UTI porque tinha uma alteração nos rins. Me informaram que ele faria vários exames e que só ficaríamos juntos no dia seguinte, mas eu não aceitei, dizia que queria meu filho. Eu me transformei com o nascimento do Manuel, renasci como pessoa, ele renovou tudo o que estava destruído em mim.

Manuel recuperou o ânimo de Marília - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Manuel recuperou o ânimo de Marília
Imagem: Arquivo Pessoal

Eu continuei morando com os meus sogros, eles me tratavam como uma filha, recebi todo apoio e conforto possível deles, da minha comadre, dos meus familiares e amigos, mas, ainda assim era muito difícil cuidar do meu filho sem a presença paterna. Ninguém pode substituir o José Roberto: cada pessoa é única.

Nesse processo, vivi um conflito de emoções pelo luto do meu marido e a alegria de ter o Manuel. Aperfeiçoei a minha fé em Deus e segui em frente. Quando meu filho completou cinco meses, eu voltei para a minha antiga casa. Minha mãe fica com a gente durante a semana, na sexta ele fica com os avôs paternos e no sábado e domingo aproveitamos para brincar e passear bastante.

Fica a saudade e a sensação de que preciso olhar para o futuro e ser feliz

O Manuel está com um ano e um mês, ele ainda não entende muita coisa, mas eu mostro a foto do meu marido e o ensino a dizer papai. Ele repete e faz carinho na imagem. Hoje o sentimento que tenho pelo José Roberto com quem tive uma união de 14 anos, não é mais de tristeza, mas, de saudade. O filho que ele me deixou me traz diariamente a sensação de que eu preciso olhar para o futuro, deixar o sofrimento para trás e ser feliz".