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Dor e machismo: o que as mães pensam ao furar (ou não) a orelha das filhas

Elisa Soupin

Colaboração para Universa

10/05/2019 04h00

Furar a orelha de crianças do sexo feminino é uma tradição, mas será que o hábito se tornou antiquado com o passar do tempo? O que pensam as mães modernas, que não acham que meninos vestem azul e meninas vestem rosa, sobre a prática de furar? Universa conversou com mulheres com diferentes pontos de vista. Spoiler: não existe resposta certa para essas perguntas. Veja os casos, que podem ajudá-la a refletir o que você quer para sua filha.

Muito pitaco e convicção deixada para trás

A pedagoga Lorena, de 29 anos, dizia que não ia furar a orelha da filha se tivesse uma menina. "Sempre tive o discurso de que não furaria, por achar que isso expressava a submissão da menina, já que meninos não passam por isso, e que não existia motivo para elas passarem", conta ela.

Com o nascimento da filha, ela foi recalculando convicções. "Quando a Serena nasceu, vi que ter filho é abrir a porta do pitaco e não fechar nunca mais. Minha sogra falava que tinha que furar logo, que se ela não quisesse, ela não usaria brinco. Mas que, quando ela entrasse na escola, todo mundo ia ter e minha filha me culparia porque, mais velha, iria doer. Minha mãe também fez um drama, falou que não furaram a orelha dela quando ela era bebê e ela só conseguiu furar aos 18 anos e sofreu porque sempre quis usar brinco. Por outro lado, meu marido e meu pai eram supercontra", lembra ela, rindo.

A decisão veio depois de muitas opiniões e da descoberta de um método menos agressivo. "Em uma consulta, a pediatra me perguntou se eu iria furar e eu falei que não sabia e ela disse 'olha, ou fura até os três meses, que realmente dói menos, ou não fura mais'. Aí eu achei um método que era totalmente indolor, com uma mulher que fazia e a criança nem mesmo acordava. Resolvi furar. Foi muita pressão externa, mas não me arrependo, ela não chorou e fica uma gracinha de brinco. O pai dela, que antes era contra, depois ficou babando, porque fica linda mesmo. Se ela quiser tirar quando crescer, tira", diz Lorena.

Primeiro, certeza absoluta, depois, desistência veemente

Julia e Maitê - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Julia e Maitê: brinco, não, obrigada!
Imagem: Arquivo Pessoal

Feminista declarada, a fotógrafa Julia Aldenucci, de 31 anos, estava, junto ao marido, superdecidida a furar a orelha da filha Maitê, de 4 meses. "A minha mãe não furou a minha orelha quando eu era bebê por princípios e sempre falou que era eu quem tinha que escolher. Admiro muito a postura dela por isso. Com cinco anos, eu pedi e furei, mas tive muita alergia e demorei uns dois anos até conseguir realmente usar brinco, doeu, rolou frustração. Então, eu sempre falei que furaria a orelha da minha filha logo, para evitar problemas", lembra.

A certeza, no entanto, foi ficando menos certa depois que ela virou mãe. "Eu comecei a pensar muito se queria realmente furar para evitar problemas futuros ou se era mais por uma vaidade minha mesmo. O tempo foi passando e fui pensando e entendendo que era vaidade, na realidade. Aí conversei com meu marido e vi que não fazia sentido sofrer tanta para dar vacinas, que são absolutamente necessárias, e voluntariamente submeter nossa filha àquela dor só pelo enfeite. Ele concordou e a gente optou por não furar. Quando ela crescer, se quiser, a gente fura", diz ela.

Espera pela decisão consciente da criança

Mariana e Isabel - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Mariana esperou Isabel pedir: e foi aos 7 anos, como ela. Na foto, com a acupunturista Gisele Àguila
Imagem: Arquivo Pessoal

Para a arquiteta Mariana Amaral, de 41 anos, mãe da Isabel, de 8, furar a orelha da filha ainda nem foi cogitado. "A minha mãe foi obrigada a furar a orelha quando ganhou um par de brincos da madrinha, quando ela tinha por volta de 3 anos. Foi bastante traumático para ela, então ela não furou das filhas; esperou a gente pedir e eu pedi aos 7 anos. Furei e depois tomamos sorvete para comemorar a minha coragem", lembra ela.

"Quando tive minha filha, não fez sentido para mim furar. Nem passou pela minha cabeça, para quê fazer uma intervenção desnecessária bebê por algo tão fútil? Daí esperei ela pedir. E ela pediu com 7 anos também", comenta, rindo da coincidência com a própria história. "Atualmente a minha filha só tem brinco em uma das orelhas. Ela tirou um dos brincos, o furo fechou e ela está feliz assim", conta.