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Memórias sexuais: entenda o que são e saiba como ativá-las

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Priscila Rodrigues

Colaboração com Universa

23/04/2019 04h00

Você está no meio de uma transa e, de repente, uma cena erótica que vivenciou há muito tempo, com outra pessoa, volta à sua mente e torna a experiência atual ainda mais excitante. Ou, durante uma sessão de masturbação que não está rolando muito bem, recorre às lembranças de um ex e, aí, sim, consegue finalmente entrar no clima.

Essas vivências não significam que você sente saudade do que aconteceu anteriormente e/ou que não está ligada em quem está com você, ali, na cama. São memórias sexuais e pertencem ao passado, mas foram tão marcantes que ainda influenciam o presente --e, desde que não seja a única maneira de você ter prazer ou cause culpa, não há problema algum nisso.

De acordo com a fisiologista Cibele Fabichak, autora do livro "Sexo, Amor, Endorfinas e Bobagens" (Matrix Editora), para entender o mecanismo por trás desse "fenômeno", primeiro é preciso compreender o que é memória, qual sua relação com as emoções, com o sexo e como podemos trazê-las de volta à consciência e usufruir delas como verdadeiros "afrodisíacos" para um relacionamento.

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A memória pode ser definida de forma simplificada como o "guardar/armazenar" informações adquiridas por meio de experiências. E somente formamos memórias a partir de fatos, emoções e experiências novas. "Sexo não deixa de ser uma experiência de exercício físico com emoção. As experiências, obviamente, estão no presente. É a memória que as transporta para o passado e as guarda temporária ou definitivamente no nosso sistema nervoso", explica.

Entretanto, não há memória sem aprendizado e, portanto, se temos memórias sexuais, significa que além do sexo ter seu componente "inato", de comportamento incondicionado, temos um componente de aprendizado pela repetição e experimentação. "Afinal, quanto mais se faz sexo, mais se aprende sobre ele, mais aptos ficamos na prática e mais memórias sexuais são formadas. Logo, as memórias são resultantes do que alguma vez já sentimos ou percebemos ou vivenciamos. E no sexo, não é diferente", conta Cibele.

As memórias adquiridas em estados de alerta e com carga emocional ou afetiva são melhor fixadas e, assim, mais lembradas em relação a fatos inexpressivos ou adquiridos em condições de quase sonolência. "Emoção e memória estão intrinsecamente ligadas, pois na emoção e no afeto gerados durante, antes ou depois de um sexo bem prazeroso e vivenciado, muitas substâncias e hormônios são liberados no corpo. A ocitocina, por exemplo, alcança altas taxas principalmente durante o orgasmo", diz a fisiologista.

Isso significa que lembrar de momentos quentes do passado durante o sexo pode, sim, ser um importante afrodisíaco, já que para a fase de excitação é necessário ter o desejo e estímulos que incluem os cinco sentidos. Só que esses estímulos sensoriais podem ser substituídos pela memória de vivências sexuais anteriores, além de acrescidos da imaginação e de fantasias sexuais já vividas ou projetadas. "Para a masturbação, as memórias sexuais são muito eficientes, já que dão o conteúdo emocional que a situação, em si, não contém", explica Carlos Eduardo Carrion, psiquiatra especializado em sexualidade, de Porto Alegre (RS).

Já Carla Cecarello, psicóloga, sexóloga consultora do site C-Date e fundadora da ABS (Associação Brasileira de Sexualidade), reforça que recorrer às memórias sexuais funciona como um combustível poderoso para aquelas fases de sexo morno numa relação ou quando o casal está junto há muito tempo e precisa de certas estratégias para entrar no clima. "Essas lembranças são ótimas para ajudar a entrar no clima, seja nas preliminares ou para ir aumentando a excitação gradativamente", diz.

Vale tudo: de uma transa memorável a um orgasmo alucinante, até (e principalmente) ocasiões marcantes justamente por terem algo diferente: um ambiente, uma palavra dita na hora certa ou uma certa urgência, como aquelas rapidinhas quentes e inesquecíveis que praticamente todo mundo já teve na trajetória.

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Cuidado com a dependência!

A geração do prazer é produzida pela liberação de dopamina, no nosso sistema nervoso, especialmente no sistema límbico, nossa "central das emoções". "Quanto mais dopamina é produzida, mais prazer é experimentado, e mais prazer nosso cérebro busca", declara Cibele. "É por isso que gerar dopamina por meio de memórias sexuais pode, dependendo da intensidade e da frequência utilizada, se tornar num vício. A base da dependência de substâncias ilícitas, tais como a cocaína, está bem explicada pela altíssima produção e liberação no cérebro de dopamina e a consequente sensação de intenso prazer. E quanto mais é liberada, mais o cérebro se torna ávido por querer cada vez mais. A adição, de forma simples, é assim explicada", prossegue a fisiologista.

É aí que mora o perigo: conforme Carla, quando a busca por prazer se torna única e exclusivamente dependente da evocação da memória, e a pessoa só consegue se excitar através de determinadas lembranças, acaba limitando muito a expressão sexual. É necessário, inclusive, cogitar a possibilidade de buscar ajuda psicológica. "Como tudo que é único, com o tempo vai perdendo o efeito. E, ao mesmo tempo, como é único, não deixa espaço para outros elementos ajudarem na relação sexual. Ou seja, com o tempo o recurso vai empobrecendo a atividade sexual, seja a dois, seja masturbatória, fazendo com que ela seja cada vez mais esporádica e menos gratificante", observa Carrion. Bem dosada, a memória sexual pode ser uma ótima estratégia para engatilhar uma conexão. Porém, é importante sempre manter o cardápio de opções para isso bem abastecido.