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Maternidade solitária: "Só queria que alguém me ajudasse com o mercado"

Taísa e Malu, de três meses - Arquivo Pessoal
Taísa e Malu, de três meses Imagem: Arquivo Pessoal

Talyta Vespa

Da Universa

16/04/2019 04h00

O anseio pela maternidade virou solidão quando a trancista Taisa Nascimento se viu pedindo desculpas aos amigos pela ausência nos rolês. Após anos tentando engravidar, a paulistana de 23 anos teve um princípio de aborto e quase perdeu o bebê. Para manter a filha segura, a recomendação médica era clara: repouso absoluto. Até para se vestir, ela precisava da ajuda do namorado.

Ali, ela conta, começou a solidão da maternidade. Taisa não podia sair de casa e teve de largar o trabalho. Dos amigos, ela recebia apenas algumas ligações, com preocupações sempre direcionadas ao bebê, nunca a ela. Com elas, vinham, ainda, as cobranças. "Eles me chamavam para sair e eu não podia", conta.

"Eu não tinha com quem compartilhar a dor e o medo de perder minha filha. Não tinha nenhuma amiga, nem parente mulher para me ajudar. Eu namorava há seis anos, mas eu e meu namorado não morávamos juntos. Tive de voltar a morar com meu pai porque, caso acontecesse alguma coisa comigo, ele estaria por perto. Hoje, moro com meu namorado. Não vejo a minha mãe com frequência, ela decidiu não me criar quando eu era bebê. Fui criada, até meus dois anos, por uma tia que mora em Pernambuco e, depois, pelo meu pai", conta.

"Minhas amigas me mandavam mensagem perguntando do bebê, mas me visitavam pouco. Pelas redes sociais, eu acompanhava suas idas à praia, restaurantes e cinemas. Era muito frustrante", continua.

Durante a gravidez, ela pediu que a sogra viesse para São Paulo. "Eu não sabia nem trocar uma fralda, estava apavorada". Mas ela não pôde. "Quando minha filha nasceu, recebi poucas visitas na maternidade. Era virada de ano. Meu namorado voltou a trabalhar depois de uma semana e eu passei a ficar sozinha durante o dia. Na primeira consulta dela, não consegui sair de casa a tempo. Precisava levar lanche e não tive tempo de comprar. Perdi a consulta e, nesse dia, sentei no chão e chorei o dia inteiro", diz.

Hoje, Malu tem três meses. Segundo Taísa, a sensação de solidão só aumenta. "Minha mãe nunca veio na minha casa; algumas amigas vieram no puerpério, mas como eu não estava muito simpática, não voltaram mais. Minha cunhada veio três vezes. Sinto falta de alguém que venha até aqui para conversar comigo, que pergunte como pode ajudar na rotina da casa. A maternidade é muito só e isso fez com que, só agora, eu começasse a me sentir próxima da minha filha".

"A única vez que uma amiga me visitou foi esse ano"

maria bebe - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

A sensação de solidão é compartilhada pela professora Maria Nolan, de 26 anos, que engravidou enquanto fazia um intercâmbio na Irlanda, em 2016. Ela, que era rodeada de amigos, se viu sozinha de uma hora para a outra. "Minha filha nasceu com Síndrome de Coffin Siris, uma doença genética grave que retarda o desenvolvimento. Quando ela nasceu, nos mudamos para uma cidade no interior da Irlanda, onde moravam os pais do meu marido. Não recebi ajuda de nenhum amigo desde então", conta.

"Meus amigos eram de rolê. Eu pagava drinques para todo mundo, todos queriam estar perto de mim. Quando minha filha nasceu, esses amigos se distanciaram. Sobrou só um que, alguns dias atrás me mandou mensagem dizendo que eu não era mais a mesma, que eu não saía mais. Eu sou mãe, não é tão simples assim", desabafa.

"Minha mãe só foi me visitar quando minha filha já tinha três meses, depois de eu chorar muito. Não comia nem dormia de tanta preocupação até descobrir o diagnóstico da doença dela. Senti falta de alguém para me ouvir, de alguém para me ajudar, falta de uma ajuda para limpar a casa. Eu passava o dia todo sozinha, das 6h às 20h".

"Voltamos para o Brasil em 2018. Antes, vim sozinha com a minha filha para tentar um diagnóstico preciso para a doença dela. Na Irlanda estava difícil, aqui, finalmente, conseguimos. Queria que meus amigos viessem em casa, se oferecessem para ficar com a minha filha enquanto eu faço terapia, por exemplo, para tratar a depressão. Não consigo fazer tratamento porque não tenho quem fique com ela. Me sinto muito só".

"Pedi carona para o médico e uma amiga me levou de cara feia"

priscila e o bebe - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

A história da analista de sistemas Priscila Bolognese, de 39 anos, é similar. A ausência dos amigos faz mais falta quando ela precisa correr com o filho, de nove anos, para o hospital. Ele tem um quadro grave de epilepsia e má-formação.

"Engravidei sem querer de um homem com quem eu namorava há sete anos. Quando contei que eu estava grávida, ele se afastou de mim. Não me ajudou em nada e só me procurava quando queria sexo. Pedi que ele fosse comigo comprar o enxoval, mas ele não foi nem me ajudou financeiramente. Ali, descobri que meu filho seria responsabilidade só minha", conta. Ela teve de parar de trabalhar para tratar as crises convulsivas do menino.

Quando o filho de Priscila nasceu, ela decidiu terminar o relacionamento com o pai da criança. "Eu não consegui voltar ao trabalho porque ele demanda muita atenção. A única pessoa que me ajuda é minha mãe. Poucas amigas foram presentes na minha vida desde então. Uma me deu um berço, a outra me levava ao hospital com frequência. Inclusive, no dia do parto, era ela quem estava comigo", diz. "Mas nos afastamos".

Segundo Priscila, o momento em que a solidão bate mais forte é quando ela precisa levar o filho ao médico. "Já pedi carona para o hospital várias vezes, mas já ouvi diversos 'nãos' de pessoas que eu considerava. Somos só eu, meu filho e minha mãe. E acho que vai ser sempre assim. Quem leva a gente no médico é um amigo da família. A gente paga a gasolina e ele faz isso".