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Primeira atriz a fazer cena de orgasmo também criou tecnologia do Wi-Fi

Hedy Lamarr protagonizou a primeira cena de orgasmo feminino no cinema, em 1933 - Divulgação
Hedy Lamarr protagonizou a primeira cena de orgasmo feminino no cinema, em 1933 Imagem: Divulgação

Marcelo Testoni

Colaboração para Universa

12/04/2019 04h00

Hedy Lamarr, nome artístico de Hedwig Eva Maria Kiesler, foi uma atriz austríaca que fez sucesso em Hollywood entre as décadas de 1940 e 1950. Protagonista da primeira cena de orgasmo feminino do cinema, no filme "Êxtase", Lamarr também foi aliada dos Estados Unidos durante a 2ª Guerra Mundial e inventora da tecnologia base das comunicações sem fio. Celulares, redes wireless e GPS tiveram origem graças à sua criação, na década de 1940.

Precursora mal acompanhada

Antes de ser inventora e estrela em Hollywood, Lamarr atuava em filmes europeus. Aos 19 anos, protagonizou "Êxtase", um filme tcheco rodado em Praga que a deixou famosa por encenar um orgasmo e aparecer nua, nadando e correndo pela natureza. Sua beleza e transgressão para a época atraíram Friedrich Mandl, um rico fabricante de armas com quem se casou em 1933 e se arrependeria pouco tempo depois. Em sua autobiografia, "Ecstasy and Me" ("Êxtase e Eu", em português), Lamarr conta que Mandl era um homem possessivo, que tentava mantê-la presa em casa e ainda a obrigava a receber, com um sorriso no rosto, fascistas e nazistas em festas e jantares de negócios.

Durante esses eventos, Lamarr, que tinha origem judia, mantinha-se muda quase o tempo todo, observando os poderosos de guerra conversarem sobre seus planos tirânicos e aprendendo sobre o que havia de mais tecnológico no momento. Um dia, cansada por estar afastada das telas por um casamento sem amor, tomou a decisão de fugir e, após drogar o marido, correu para Paris levando consigo uma mala cheia de joias. Da França foi para a Inglaterra, onde embarcou no transatlântico Normandie com destino aos Estados Unidos.

Sucesso também fora das telas

"Em Hollywood, mudou seu nome para Hedy Lamarr e se tornou uma das estrelas mais glamorosas do cinema. Ela trabalhou com diretores renomados como King Vidor, Victor Fleming e Cecil B. DeMille, e contracenou com atores respeitados como Clark Gable, Spencer Tracy, John Garfield e James Stewart", comenta Stephen Michael Shearer em seu livro "Beautiful: The Life of Hedy Lamarr" (Linda: A Vida de Hedy Lamarr, em português).

Tocando piano, Lamarr teve a ideia de uma tecnologia que poderia ajudar os EUA a vencerem a Segunda Guerra - Divulgação - Divulgação
Tocando piano, Lamarr teve a ideia de uma tecnologia que poderia ajudar os EUA a vencerem a Segunda Guerra
Imagem: Divulgação

Embora fizesse sucesso no cinema, Lamarr tinha aprendido muito com os nazistas e queria ajudar os Estados Unidos a vencerem a Segunda Guerra. Em 1940, conheceu George Antheil, um compositor musical que viria a contribuir com seu talento inventivo. Uma noite, quando os dois brincavam de dueto em frente a um piano, Lamarr percebeu que, ao reproduzir as notas tocadas por Antheil em outra escala, frequências diferentes eram emitidas. Para ela, algo semelhante poderia ser aplicado pelas estações de radiocomunicação americanas, que se trocassem várias vezes de frequência coordenadamente, impediriam que os nazistas rastreassem códigos e mensagens de guerra, como o direcionamento de torpedos, que eram alvos fáceis de serem interceptados e destruídos pelos inimigos. Aperfeiçoado por Antheil, o sistema de Lamarr ganhou o nome "salto de frequência".

Talento subestimado pela beleza

Lamarr compartilhou a autoria da invenção com Antheil e depois os dois a ofereceram aos militares, que a rejeitaram por achá-la difícil e cara demais para ser desenvolvida na época. Informaram ainda que Lamarr ajudaria mais animando tropas e vendendo beijos. Arrasada, a atriz então passou a dar declarações polêmicas, como "meu rosto foi minha ruína" e "qualquer garota pode ser glamorosa, basta ficar quietinha e parecer burra". Sua convicção de que era tratada apenas como um rostinho bonito se confirmou em 1949, quando foi eleita pelo Clube da Imprensa Feminina de Hollywood a atriz menos cooperativa do ano.

O "salto de frequência" só começou a ganhar visibilidade décadas depois. Em 1962, foi aplicado para bloquear Cuba durante a Crise dos Mísseis e, posteriormente, durante a Guerra do Vietnã (1955-1975). Com o tempo, a patente expirou e deixou de ser restrita aos militares, sendo aplicada como base de várias tecnologias modernas. Ela está presente, por exemplo, em satélites do sistema de posicionamento global (GPS) e também no Wi-Fi e no Bluetooth.

Tratada a vida toda como símbolo sexual, ela só foi reconhecida como cientista em 1997 - Divulgação - Divulgação
Tratada a vida toda como símbolo sexual, ela só foi reconhecida como cientista em 1997
Imagem: Divulgação

Quanto aos seus autores, o reconhecimento veio tarde demais. Em 1997, receberam do Governo dos Estados Unidos uma menção honrosa "por abrir novos caminhos nas fronteiras da eletrônica" e um prêmio da Electronic Frontier Foundation. Àquela altura, Antheil já havia morrido há quase 40 anos e Lamarr, que vivia apenas com uma aposentadoria do Sindicato dos Atores, tinha mais de 80 anos. À Universa, o filho da atriz, Anthony Loder, declarou: "Minha mãe nunca ganhou um dólar pela invenção tecnológica que criou". Em 2017, a produtora Alexandra Dean lançou o documentário "Bombshell: The Hedy Lamarr Story" ("Bombástica: A História de Hedy Lamarr", em português), sobre a história injustiçada da atriz.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que foi publicado anteriormente, o título oficial (em português) do documentário sobre a atriz é ?Bombástica: A História de Hedy Lamarr?. A informação foi corrigida.