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Mulheres gordas contam propostas abusivas que recebem nos apps de paquera

Nos aplicativos de paquera, elas contam receber muitas propostas para realizar fantasias  - Getty Images/iStockphoto
Nos aplicativos de paquera, elas contam receber muitas propostas para realizar fantasias Imagem: Getty Images/iStockphoto

Carolina Prado e Simone Cunha

Colaboração para Universa

17/01/2019 04h00

Nos apps de paquera, as propostas para a realização de fantasias, por parte dos homens, com mulheres gordas são recorrentes. É o que garante a bancária Gizela Fonseca, de 37 anos, usuária desses aplicativos. Segundo ela, alguns homens acreditam que a mulher acima do peso é pouco atraente e, por isso, aceita fazer "qualquer coisa" para manter-se sexualmente ativa. "Supostamente, essa mulher topa fazer anal, oral nele e espanhola, devido aos peitos maiores", conta Gizela. A bancária diz que levou bastante tempo para lidar com problemas como esse, relacionados ao peso. "Fiz cinco anos de terapia. Ela me ajudou muito no processo de autoaceitação", afirma. 

Para a psicóloga e sexóloga Carla Cecarello, é fundamental que a mulher não faça nada contra a própria vontade. "Se ela se submeter aos caprichos do outro, se colocará na situação de que ninguém a deseja porque ela é gorda, perpetuando assim, uma ideia equivocada sobre esse perfil", alerta Carla. 

É preciso cuidado para que o sentimento de baixa autoestima relacionado às insatisfações com o corpo não predisponha à aceitação de propostas consideradas abusivas. "Nesses casos, é como se a própria mulher não se considerasse digna de ser querida e desejada, de fato, confirmando uma crença negativa que tem de si mesma", explica a psicóloga Rogéria Taragano, mestre pela FMUSP e colaboradora no Programa de Transtornos Alimentares do HC. 

Rogéria ressalta que toda mulher deve satisfazer também aos seus desejos, percebendo que tem o direito de escolher a situação, o tipo de encontro e a pessoa com quem vai estar: "Ela não deve ficar em uma posição tão passiva. É importante que tome também as decisões, não se deixando apenas ser escolhida." 

Mudança de mentalidade 

"A representatividade da gorda real ainda está longe de se consolidar, e essa é a única forma de inibir o fetichismo", fala a advogada Izamara Alves. Para ela, ainda existe pouca visibilidade da mulher que está acima do peso em séries, novelas e filmes. "A obesidade aparece sempre relacionada a um escape cômico do enredo dramaturgo. Por isso, muitas mulheres acabam aceitando realizar certas fantasias, pois sua imagem está completamente banalizada", diz a advogada. Ela acha que por causa dessa fragilidade, muitas acabam ficando com pessoas que não as valorizam, sem se questionar se realmente merecem um relacionamento assim. 

Segundo Rogéria, a terapia pode contribuir para trabalhar questões relacionadas à baixa autoestima, ajudando a mulher a descobrir seus gostos e suas vontades. A psicóloga afirma que é preciso iniciar um processo de autoconhecimento para lidar melhor com o preconceito dos outros e com o próprio, pois muitas mulheres ainda precisam aprender a se amar como são. "É preciso ter claro que existe uma dificuldade concreta em lidar com a questão do peso e da alimentação, mas que ela pode desenvolver projetos interessantes, que lhe tragam senso de realização e significado, ficando menos vulnerável às questões da autoimagem", reforça. 

Izamara conta que já recebeu algumas propostas indecentes, sob a mesma justificativa, a "vontade de ficar com uma mulher gorda para ver como é". Mas não topou. "Me senti usada e objetificada; ele queria completar a lista de desejos dele transando com uma gorda, mas de forma oculta", conta.  

Para pular fora 

No app de paquera, Gizela diz que prefere colocar foto de corpo inteiro, para não ter que lidar com a fisionomia de surpresa do outro na hora do encontro, por causa dos quilos a mais. "Se o homem apresenta alguma proposta bizarra, já aviso que não estou disponível. A gente precisa se impor e sentir-se interessante, caso contrário, não conseguirá convencer o outro", diz. 

Já a influencer digital Camila Fernanda de Oliveira Machado, de 34 anos, diz que sempre posta fotos de biquíni ou lingerie com o intuito de ser um perfil motivacional, mostrando que a mulher gorda também pode fazer qualquer tipo de ensaio fotográfico e ser sexy. "Comecei a receber propostas abusivas. Um dos caras disse que adorava sair com mulher gorda porque elas não têm atrativo e se matam para satisfazer o homem na cama. E questionou se eu era dessas. No começo, eu discutia, mas depois, passei a ignorar", conta Camila. 

O importante é não entrar em cilada por pura insegurança. "Quem tem a necessidade de negar e fazer um discurso em cima disso, pode fazê-lo. Quem prefere apenas cair fora, tudo bem. Isso vai ao encontro do estilo de cada uma", diz a sexóloga.

"Se a mulher aceitar porque é um desejo dela, sem problemas. Ela precisa sempre levar em conta a sua possibilidade de escolher", afirma Rogéria.

E, mais que isso, nutrir a certeza de que pode ter um relacionamento bacana, muito além do sexo, se assim desejar. "Ela tem que apostar nisso: ser autêntica, mostrar a pessoa quem ela é, se colocar bonita, soltar o próprio corpo e deixar a sensualidade fluir", finaliza Carla.