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Izabella Camargo, em ministério de Bolsonaro: "Não vou ficar desempregada"

Izabella Camargo na primeira entrevista feita com Pontes, em maio deste ano - Reprodução
Izabella Camargo na primeira entrevista feita com Pontes, em maio deste ano Imagem: Reprodução

Marcos Candido

Da Universa

07/01/2019 04h00

"Você quer fazer uma entrevista sobre o novo cargo, sobre mim ou sobre o burnout?", diz Izabella Camargo. A pergunta não é à toa. Em poucos meses, a vida da jornalista mudou completamente, e a transformação envolve os três temas. 

Em novembro, Izabella foi demitida da Globo após receber um diagnóstico de Síndrome de Burnout. Assim que o presidente Jair Bolsonaro subiu a rampa, quase dois meses depois, seu nome foi anunciado para integrar a equipe de comunicação do Ministério da Ciência e Tecnologia. O convite foi feito pelo ministro e astronauta Marcos Pontes.

Izabella Camargo em posse de ministro Marcos Pontes - Reprodução/Instagram/izabellacamargoreal - Reprodução/Instagram/izabellacamargoreal
Imagem: Reprodução/Instagram/izabellacamargoreal

Antes disso tudo acontecer, Izabella trabalhou como bailarina do programa "Fantasia", na década de 90, e foi repórter em grandes emissoras de rádio e TV. Na Globo, trabalhou durante seis anos durante as madrugadas. Até adoecer. 

Burnout

"O burnout é quando seu corpo chega ao limite físico, emocional e neurológico. Você não consegue fazer com agilidade e facilidade o que sempre fez", explica. Desenvolveu depressão e problemas físicos até ter um apagão no ar. O esgotamento era escondido pela maquiagem. Foi demitida da emissora, que não a mudou de horário -- seu pedido por anos. 

Izabella diz que refletiu para aceitar o cargo oferecido pelo ministro de Bolsonaro, mas que tomou o convite como uma missão pessoal -- mesmo em um governo polêmico. "Eu não vou ficar desempregada ou pensando na morte da bezerra porque existem ideias assim ou assado. A minha ideia é uma só: contribuir com quem está ao redor." À Universa, ela fala sobre esta nova etapa. 

Como surgiu o convite para participar do Ministério?

O convite surgiu a partir de dezembro, quando fui chamada para integrar a equipe de comunicação. O Ministério é muito grande e tem muita coisa para ser divulgada sobre ciência. O convite foi um voto de confiança ao meu profissionalismo por mais de vinte anos em rádio e TV. Nunca trabalhei com política, e ainda não sei destas dinâmicas, mas só começo a trabalhar quando meu nome for publicado no Diário Oficial.

Você já tinha contato com o ministro?

Eu conheci o Marcos Pontes por meio de uma jornalista, Neila Rocha Oliveira, que leu uma entrevista minha ao UOL. Eu estava escrevendo um livro sobre como as sensações de tempo interferem com as pessoas. Ela me colocou em contato com o astronauta para explicar a percepção do tempo no espaço. Eu já tinha entrevistado astrônomos, cosmólogos, professores e médicos.

O Pontes me explicou como é a percepção no espaço e como era a contagem do tempo lá. A conversa aconteceu no primeiro semestre do ano passado. Depois, ele me convidou para palestrar sobre jornalismo em um evento em Bauru, interior de São Paulo, em julho deste ano. Fiz um convite a pessoas que entrevistei para irem ao balé dos cegos, em São Paulo, meses depois e, por ter agenda na cidade, Marcos foi um dos meus entrevistados que compareceu. Ao receber o convite [para o Ministério], pensei por um bom tempo, mas topei trabalhar para a divulgação de projetos científicos. A minha missão é a mesma do Marcos [Pontes]: o desenvolvimento humano.

Você fez ponderações para assumir?

Não tenho como falar sobre isso, porque ainda não comecei a trabalhar oficialmente.

Mas você teve receio em se atrelar à política?

Trabalho em um ministério que contribui com a sociedade. É o que faço como jornalista, entende? Não posso ter preconceitos em participar na área de comunicação de um ministério. Quando fiz a previsão do tempo na Globo, ouvi que tinha capacidade para fazer mais.

Por ser filha de agricultor e entender como a ciência atinge a vida de tantas pessoas, eu tinha que cumprir aquela função. Quantas reportagens que já fiz que, independentemente se eu aceitasse e concordasse, eu tive que informar? Eu vou informar o que estiver ao meu alcance e que não fuja dos meus valores morais. Se qualquer pessoa me oferecesse um papel para ajudar no desenvolvimento humano e falar a verdade, eu aceitaria.

A gente não precisa mais de mimimi, ou de conversa fiada. A gente precisa de esclarecimento

Quais são seus princípios morais?

Eu sou filha de agricultores. Meus princípios são o respeito ao próximo, respeito à natureza e uma vontade genuína de contribuir de saber a história de quem quer que seja e ajudar. É bastante idealismo e altruísmo. São essas as minhas referências. Quando falam valores morais, eu falo do respeito com cada um. É importante dizer que sou apartidária. Sou a-par-ti-dá-ria. Não tenho ligação com nenhum partido. Tenho a missão direta de contribuir para que as pessoas saibam o que acontece, que é o que faço desde que me formei em jornalismo.

Mas o governo eleito já tem sido visto com preocupação em relação a causas como a de preservação ambiental e de respeito de minorias, como a LGBT. Integrar-se a este grupo de certa forma não contradiz com valores tão basilares a você?

Se eu não fizer a minha missão como jornalista para contribuir com a parcela que vai me ouvir, e tiver medo disso, não faço nada na vida. É o que Gandhi diz: seja a mudança que você quer para o mundo. Eu não vou ficar desempregada ou pensando na morte da bezerra porque existem ideias assim ou assado. A minha ideia é uma só: contribuir com quem está ao redor. Farei o que eu puder contribuir, compartilhar e aprender.

Eu não vou falar do que ainda não tenho propriedade, ou de outros ministérios. Só posso falar do que eu vou fazer: buscar uma comunicação clara. A gente não precisa mais de mimimi, ou de conversa fiada. A gente precisa de esclarecimento. Entre ficar em casa, eu prefiro investir o meu conhecimento com humildade para divulgar projetos científicos. Ponto.