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Nova ministra de Mulheres é pastora, foi abusada e tem filha indígena

Damares Alves foi anunciada nesta quinta-feira (6) como ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos do governo Bolsonaro - Reprodução/YouTube Arolde de Oliveira
Damares Alves foi anunciada nesta quinta-feira (6) como ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos do governo Bolsonaro Imagem: Reprodução/YouTube Arolde de Oliveira

Camila Brandalise

Da Universa

06/12/2018 19h42

Na quinta-feira (6), o futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciou a pastora da Igreja Batista e advogada Damares Alves, assessora parlamentar do senador Magno Malta  (PR-ES), como ministra de Mulher, Família e Direitos Humanos no governo do presidente eleito Jair Bolsonaro.

Damares é contra o aborto, a legalização das drogas, as discussões de gênero e dos direitos LGBT. Tem um extenso trabalho de proteção à infância. É integrante da Rede Nacional Infância Protegida e se dedica ao tema em suas pregações como pastora, em palestras e no Congresso, onde foi assessora jurídica de Malta na CPI da Pedofilia. Afirma se dedicar à causa porque sofreu abusos de pastores quando tinha 6 anos e quer evitar que outras pessoas passem pela mesma situação. "Sou sobrevivente da pedofilia. Só quem passou por esse calvário é que sabe o que querem fazer com as nossas crianças."

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Também é atuante na questão indígena desde a década de 1990, principalmente em relação às crianças. Damares é fundadora da ONG Atini, que acolhe mães e bebês indígenas em situação de risco. Ela também é mãe adotiva de uma menina, que ela diz ter sido rejeitada por uma tribo ainda pequena. Hoje a garota tem 19 anos. 

Como foi o convite para ser ministra?
Na quarta-feira (28) encontrei o capitão (Jair Bolsonaro) e ele me convidou para trabalhar com políticas públicas para mulheres, ainda na dúvida se seria no Ministério ou em uma secretaria. Pedi uns dias para pensar. Nunca fui do executivo. Trabalho no Congresso como assessora jurídica há 20 anos, e o capitão me conhece, conhece todos os meus enfrentamentos, minhas lutas pelas mulheres e pela proteção da infância. Então quando se fala de mulher, ele lembra de mim, quando se fala de criança, abuso e violência, ele lembra de mim. À medida que conversamos, soube que seria na mesma pasta da Família. Na terça-feira (4) liguei para ele dizendo que aceitava, que estava à disposição como um soldado nesse exército de mudanças que ele propõe, mesmo que seja para servir café. Só ontem soube que incluiria a Funai também.


Há uma especulação de que sua nomeação foi uma maneira de compensar o fato do senador Magno Malta não ter sido indicado para um ministério.
De jeito nenhum, isso não é verdade. Inclusive, na quarta passada, quando me foi feito o convite, saí da sala de transição e liguei para ele. Ele vibrou, ficou muito feliz. Além do que, ele nunca seria convidado para uma pasta sobre mulheres. Me convidaram por causa da minha capacidade.

Qual vai ser sua prioridade como ministra?
O capitão sempre prometeu combater a violência, como um todo. Essa pasta vai seguir isso, vai lidar com vidas, protegê-las. É uma pasta delicada, especial, vai lidar com proteção de crianças e adolescentes. Queremos construir um grande pacto nacional pela infância, vamos sentar com comunidades, religiões, sociedade, imprensa, rever tudo que está posto para crianças e o que fazer para melhorar. Temos 30 crianças assassinadas por dia no Brasil. É muito. O que fazer para mudar isso? Por meio de políticas públicas, vamos agir para que as leis sejam seguidas. Primeiro faremos um mapeamento das situações, conversar com pessoas para saber o que está acontecendo e como fazer para resolver os problemas.

Tem projeto para mulheres?
Vamos tentar trazer para o protagonismo as mulheres que estão invisíveis. As ciganas, por exemplo. Onde elas estão? Como as políticas públicas estão chegando para essas mulheres?
Além delas, as ribeirinhas, quebradoras de coco, seringueiras, como as políticas estão chegando para elas?

Vai ter algum posicionamento em relação ao aborto?
Não. E nem vou me pronunciar sobre esse tema como ministra. Quem tem que lidar com isso são os congressistas. Pessoalmente, ao longo da minha vida, sou contra, e não abro mão. A legislação atual (que assegura interrupção de gravidez em casos de estupro, risco para mãe ou feto e anencefalia) não precisa ser alterada. Mas, em outros casos, aborto é morte. 

Mas e quanto às mulheres que estão morrendo por procurarem aborto ilegal, o que fará?
Existem mulheres que buscam aborto e morrem, mas esse número não é tão grande. Primeiro, vou levantar os dados exatos, ver quem está morrendo. Mas não considero tema de saúde pública. E, de novo, quem vai decidir sobre isso é o Congresso, não a pasta que vou ocupar.

Como defensora dos direitos indígenas, o que acha das declarações de Bolsonaro sobre acabar com a demarcação de reservas?
Como só soube que minha pasta abarcaria a Funai (Fundação Nacional do Índio) ontem (quarta-feira, dia 5), ainda não deu tempo de conversar com ele sobre a questão das demarcações. Então prefiro não me posicionar sem antes falar com ele. De qualquer forma, o índio é muito mais do que a terra. Vamos manter a garantia às manifestações culturais deles.

A campanha de Bolsonaro foi marcada pela presença de mulheres com números recorde de votos, como Joice Hasselmann e Janaína Paschoal. O que acha delas?
Conheci Janaína no período do impeachment, sou uma eterna admiradora da professora. Sou jurista, e todos nós do meio jurídico a respeitamos muito. A Joice conhecia de redes socias e hoje (quinta-feira, dia 6) foi pessoalmente. Ela é linda, exuberante, fará um trabalho espetacular. Além delas, citaria outras mulheres que admiro: a Bia Kicis (PRP), deputada federal eleita pelo Distrito Federal, minha amiga pessoal; e a Ana Caroline Campagnolo (eleita deputada estadual pelo PSL), que conheci quando soube que estava sendo perseguida na universidade por ser muito cristã.

A senhora é pastora e fala muito sobre sua religião em suas aparições públicas. Não acha que esse histórico pode intimidar brasileiros de outras fés ou mesmo ateus?
Quem está assumindo o ministério não é a pastora, é a ministra. A prioridade é a vida, que ultrapassa qualquer segmento religioso. Minha fé motiva todas as causas mas não será imposta a ninguém. Vou lutar pela vida.

A senhora já se posicionou contra direitos LGBT, como quando criticou o Supremo Tribunal Federal por estar discutindo o direito de uma pessoa trans usar um banheiro condizente com o gênero em que se reconhece. Isso não é preconceituoso?
Jamais me posicionei contra, os direitos civis adquiridos não estão em risco. Me posiciono contra a ideologia de gênero. Sobre essa questão do banheiro, minha preocupação é com a menina, não entendo que seja oportuno que uma menina de cinco anos sente em um vaso que um travesti sentar antes, essa pessoa faz xixi em pé. Não podemos discriminar, e entendo que nos banheiros masculinos acontecem brincadeiras e agressões contra trans. Essa questão é delicada, não sei dizer como pode ser resolvida.