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"Meu ex me roubou pra sustentar outra família; paguei R$ 45 mil sozinha"

Mônica Lemos é cozinheira no Trampolim Start Up Café - Divulgação
Mônica Lemos é cozinheira no Trampolim Start Up Café Imagem: Divulgação

Talyta Vespa

Da Universa

22/10/2018 04h00

Faltam apenas duas parcelas da dívida de R$ 45 mil para que Mônica Lemos, de 50 anos, volte a ter o nome limpo. Desde 2008, ela está na lista de devedores do SPC depois de ter sido roubada pelo ex-marido. A renda do casal vinha das comidas que ela preparava para vender.

Ao marido, cabia a responsabilidade de cuidar das finanças – todo dinheiro de trabalho era guardado em uma poupança. A cozinheira só descobriu que havia sido roubada e enganada pelo marido, que tinha outra família e usava o dinheiro das vendas para sustentá-los, quando surgiu uma emergência e ela precisou da grana guardada. Não tinha um real. Hoje, ela trabalha com culinária em São Paulo e sonha em construir a própria casa – com um puxadinho para a cozinha industrial que quer empreender.

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“Foram 23 anos de casamento, três filhos, até eu descobrir que meu então marido tinha outra família: uma mulher e dois filhos. E pior: que ele pegou todo o dinheiro que guardei cozinhando para fora por anos para sustentá-los. Eu mesma cozinhava e fazia as entregas. A ele, cabia apenas cuidar da parte administrativa. Um dia, saí com o carro para entregar as encomendas e o motor quebrou. Levei ao mecânico e, quando fui pegar o dinheiro da poupança para pagar o conserto, não tinha um real.

Depois, descobri que ele não pagava os fornecedores e que eu tinha uma dívida de R$ 45 mil. Foi desesperador. Disse que me separaria dele e pedi que me desse alguns dias para que eu encontrasse um lugar para morar. Só que minha cunhada, que não quis entender o que tinha acontecido, ordenou que eu saísse naquele momento. Me expulsou da casa que ajudei a construir com um pedaço de pau. Eu coloquei tijolo em cima de tijolo.

Fui para a casa da minha mãe com dois filhos, uma mão na frente e outra atrás. Minha mais velha continuou morando com o pai. Para sustentá-los e tentar pagar as dívidas, consegui dois empregos, fora da cozinha, que era o que eu gostava. Das 7 às 16h, trabalhava com telemarketing. Das 16h30 às 23h, como atendente em uma empresa de reserva de passagem aérea. Até que um dia, enquanto ia ao trabalho, senti dores no estômago, nas pernas e desmaiei no metrô.

Acordei já no hospital e soube que tive um infarto. O médico me disse: ‘Se você não largar um dos empregos, vai morrer’. Senti medo, achei que não conseguiria sustentar meus filhos. Abandonei um dos trabalhos, mas voltei a fazer doces para vender. Comecei com bem-casados, me ofereci para trabalhar como garçonete em eventos, para lavar prato. Tranquei a faculdade de administração, que cursei por dois semestres, porque não tinha como pagar. Meu sonho, mesmo, era fazer gastronomia.

Todos os dias, eu passava por entrevistas de emprego, mas via mulheres com muito menos experiência que eu conseguindo as vagas por serem brancas e jovens. Eu sou negra, estava com 45 anos e pensei em desistir. Achei que não conseguiria. Até que conheci a ONG Afrobusiness, que facilita o contato entre empreendedores negros e o mercado. A presidente da ONG me disse que uma amiga dela abriria um restaurante e perguntou se eu tinha interesse em participar do processo seletivo.

Finalmente, consegui. Entrei no Trampolim Start Up Café como auxiliar de cozinha e, em menos de um ano, fui promovida à cozinheira. Consegui, depois de tudo o que passei, voltar a trabalhar com o que amo. Com a ajuda do sindicato, já fiz curso de gestão em hotelaria, de alimentos e bebidas e de panificação. Agora, faço aulas de inglês e no ano que vem quero voltar a estudar administração. Quero abrir meu negócio, né?

Também sonho em estudar gastronomia fora do País. Estou perto de quitar minha dívida, faltam apenas duas parcelas para que meu nome fique limpo. Estou tão feliz! O próximo passo é construir uma casa para eu morar com meus filhos e fazer um puxadinho, onde vai ser minha cozinha industrial.

O recomeço é muito difícil, mas não é impossível. É como matar um leão por dia. As amizades se vão, as portas se fecham, eu queria chorar e não tinha um ombro. Mas, perseverei. Hoje, meus filhos podem cuidar dos estudos e do futuro. É o que importa."

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