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"Meu ex-marido me persegue e até passou com o carro em cima do meu pé"

Getty Images
Imagem: Getty Images

Em depoimento à Beatriz Santos

Colaboração para Universa

09/10/2018 04h00

Há um ano, a cabeleireira Fabia*, 33, se separou de um homem que a agredia fisicamente, mas, desde então, é perseguida por ele. Recentemente, ele a arrastou com o carro e passou com o veículo sobre a perna dela. Agora, ela conseguiu uma medida protetiva, mas a sensação de insegurança, por ela e pelas filhas de 8 e 14 anos, permanece. A seguir, ela conta como tem enfrentado um ex-marido agressor.

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“Eu conheci o meu ex-marido quando eu tinha 13 anos. Foi meu primeiro e único namorado. Namoramos por quatro anos e, aos 17, eu casei. Vivíamos uma vida que parecia estável, ele era carinhoso e atencioso comigo. Logo, eu engravidei da minha primeira filha e ele também se mostrou bom pai.

No terceiro ano do nosso casamento, porém, eu tive a primeira decepção. Descobri que ele teve um filho enquanto estávamos juntos. Sofri muito na época, mas ele ainda era um bom marido, eu o amava e perdoei.

Desde o início do nosso casamento, eu ficava em casa sozinha com a minha filha. Eu era costureira. Só saía para ir à igreja, sou evangélica, e voltar. Já ele sempre teve uma vida social agitada, saía do trabalho e ia para a noitada.

A minha segunda filha veio seis anos depois da primeira e, depois que ela nasceu, eu decidi trabalhar fora. Ele tentou me impedir na época, disse que não entendia a necessidade de ter um emprego, porque achava meu trabalho de costureira ótimo. Mas não me impediu quando eu quis ir em frente, mesmo com ele não gostando muito.

Nessa fase, também comecei a ter vida social: eu comecei a sair mais com as minhas amigas. E foi após uma saída dessas que ele me agrediu pela primeira vez. Era uma época fria e eu fui tomar sopa com uma amiga. Quando cheguei em casa, ele quis olhar o meu celular.

Eu não deixei e começamos a bater boca. No meio da discussão, ele ficou tão irritado e tentou me asfixiar. Nós morávamos na casa da minha família e minha irmã entrou no meio para ele não me machucar.

Aquilo nunca tinha acontecido, mas depois da primeira vez, vieram muitas outras. Outro episódio foi quando meu celular tocou e eu não quis atender. Ele entendeu que aquilo era um sinal de traição minha e veio para cima de mim.

Dessa vez, foi a minha filha mais velha quem apartou. Novamente, ele jurou que não faria isso novamente, mas eu não acreditei e saí de casa depois de 14 anos de casamento.

Perseguição e atropelamento

A partir de então, novembro de 2017, a minha vida ficou horrível. Ele passou a me perseguir em todos os cantos. Se eu estou em um bar, 30 minutos depois de eu chegar, ele aparece. Ele fica no início da viela onde eu moro olhando a minha casa, talvez esperando eu sair.

Ele liga no celular das minhas filhas, querendo saber de mim. E quando eu digo para as pessoas o que ele faz, ele responde que eu sou louca, que ele nunca foi atrás de mim.

Recentemente, no mês de setembro, eu estava com algumas amigas em um restaurante quando, do nada, ele entrou no local. Cumprimentou todas nós, pegou um copo cheio da mesa e jogou o líquido todo na minha cara, sem dizer nada. E saiu andando.

Com medo que ele voltasse, decidimos ir embora. De fato, voltou. Encontramos com ele quando estávamos indo para o carro. Minha amiga foi conversar com ele. Falaram um pouco, mas ele se irritou com ela e arrancou com o carro, derrubando ela com tudo no chão.

Depois de acudi-la, fui até a janela do carro dele para discutir. Coloquei a minha mão esquerda apoiada no vidro e, enquanto eu falava, ele me mordeu.

Comecei a gritar para ele soltar minha mão. Mas, ao invés disso, me segurou com a mão que não estava no volante e acelerou o carro, me arrastando pela rua até que eu caísse no chão. Ao cair, ele passou com o carro em cima do meu pé.

A dor foi tanta que até hoje não me recuperei. Fui levada ao hospital pelos meus amigos e não tive nenhuma fratura. Mas eu ainda não fico com o pé firme no chão. Também não posso usar salto. Quatro dias depois, quando já conseguia andar, fiz um boletim de ocorrência.

Eu já tinha dado queixa dele outras vezes, mas elas nunca deram em nada. Eu também já tinha acionado a polícia ao ver ele parado na rua da minha casa, mas até a polícia chegar, ele ia embora. Cheguei a falar com uma ONG, mas a única coisa que me ofereceram foi abrigo para ‘fugir’ dele e eu não queria isso. Eu tenho minha casa, não quero ir para abrigos.

Mais agressão e uma ajuda

Duas semanas depois do atropelamento, fui buscar a minha filha que estava em uma festa da sobrinha dele. Logo que me viu, ele ficou irritado. Disse que não ficaria ali comigo, se eu ficasse, ele iria embora. A dona da casa disse que ele poderia ir.

Ele foi andando em direção ao carro e eu até à sala, para cumprimentar o pessoal que estava lá. Fiquei de costas para porta e senti uma dor, ele tinha me dado um soco nas costas. Nessa hora, minhas duas filhas foram para cima dele. Ele puxou o cabelo da mais velha, deu um tapa na cara dela e a chamou de vagabunda. Ele ainda bateu com uma latinha de cerveja no meu rosto.

Na mesma hora, comecei a tirar foto de tudo para registrar, mas um sobrinho dele entrou no meu carro, quando eu estava indo embora com as minhas filhas, e roubou meu celular. Perdi as provas que tinham ali. Mas eu já vinha fazendo alguns posts no Facebook, para deixar registrado o que acontecia.

Uma vizinha viu uma das minhas publicações, me chamou e disse que me ajudaria. Ela me apresentou uma pessoa do Bem Querer Mulher [ONG para o enfrentamento da violência contra a mulher]. Com o auxílio deles, consegui uma medida protetiva contra ele. Ele tem que ficar 6 metros de distância de mim. A ONG também entrou com um pedido de prisão dele.

Mas eu ainda me sinto muito desprotegida. Às vezes, estou trabalhando e ele passa na frente do salão onde sou cabeleireira, olhando para dentro, como se estivesse me procurando. Não consigo mais deixar as minhas filhas sozinhas, trago as duas para o meu trabalho. Elas vão para escola e depois ficam o restante do dia comigo. Sei que não é o ideal, mas não tenho escolha neste momento, com ele por aí.”

*O nome foi alterado para preservar a identidade da entrevistada.

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