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Igreja evangélica dos famosos quer dar poder às mulheres (de unha feita)

A pastora Lucy Mendez (à dir.) em evento de "empoderamento" de evangélicas; à esquerda, a tradutora Thiciane Albuquerque - Divulgação/Hillsong
A pastora Lucy Mendez (à dir.) em evento de "empoderamento" de evangélicas; à esquerda, a tradutora Thiciane Albuquerque Imagem: Divulgação/Hillsong

Camila Brandalise

Da Universa

31/08/2018 04h00

Fundadora, ao lado do marido, da igreja australiana Hillsong, hoje um fenômeno religioso global com cultos no Brasil, Bobbie Houston, 61, recebeu uma mensagem de Deus, há 35 anos, orientando-a a criar um grupo de orações só de mulheres.

O modelo dos encontros da Sisterhood (irmandade, em inglês) foi então formulado: o culto teria música e pregação, como as reuniões gerais da igreja, mas receberia as fiéis para serviços de salão de beleza, cabelo, maquiagem, esmalteria e massagem de graça.

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É assim até hoje, inclusive na versão brasileira. Com a chegada da igreja em São Paulo, em outubro de 2016, as reuniões da Sisterhood passaram a ser organizadas no ano passado e já aconteceram cinco edições. A última delas foi na sexta-feira passada, dia 24 de agosto.

A ideia de Bobbie, autora de best-sellers falando do poder feminino, é estimular o “empoderamento” das mulheres.

A novidade é falar em empoderamento em um contexto religioso, já que a palavra normalmente é usada em discussões feministas e significa possibilitar que a mulher tenha o poder de decidir sobre a própria vida e o corpo - e muitas vezes têm a ver com deixar dogmas religiosos de lado para fazer o que quiser.

Na Hillsong ganha outro significado. “Falamos em empoderar no sentido de mostrar que Deus dá permissão para as mulheres serem tudo que Ele quer elas sejam”, afirma a pastora Lucy Mendez, 37 anos, argentina criada na Austrália e pastora-líder, ao lado do marido, Chris, das filiais em Buenos Aires e São Paulo.  

Salão de beleza da fé

Esmalteria sisterhood - Divulgação/Hillsong - Divulgação/Hillsong
Manicure antecede culto
Imagem: Divulgação/Hillsong

Meia hora antes de abrir a casa de shows em que são realizados os cultos, na Vila Olímpia, bairro da zona sul de São Paulo, dezenas de mulheres já esperavam na frente do lugar. A expectativa era não só pela reunião, mas também pelos serviços oferecidos no início do encontro: no hall, estava montado uma espécie de salão de beleza.

De um lado, cadeiras, escovas e secadores para arrumar os cabelos das fiéis, que poderiam também ser maquiadas. No centro, mesas com manicures para fazer esmalteria. Em outro canto, massagem. A razão por trás disso, segundo Lucy, não se limita à aparência. “É uma maneira de fazê-las se sentirem confortáveis em nossa casa”, diz. “Acho que atrai muito porque, prestando esses serviços, as mulheres se sentem cuidadas”, afirma a médica Raíssa Almeida, 27 anos, frequentadora da Sisterhood.

Pregação feminina

Nos últimos 40 minutos do culto, Lucy, que viajou no mesmo dia a São Paulo para o encontro, começou sua pregação. Não fez citações específicas a mulheres - são cerca de 500 na plateia - nem diz o que uma tem ou não que fazer. O que reforça o tempo todo é a importância de cada uma encontrar seus pontos fortes e usá-los em suas vidas.

Na parte em que lê alguns dos pedidos de oração de fiéis, escritos em papéis no começo do rito e entregues à pastora, aparecem várias citações a relacionamentos. Um deles é para ter paz no casamento. Outro, para achar um parceiro. “Não tem nada impossível para Deus”, diz Lucy. Cura da depressão, do câncer e busca por emprego também aparecem na lista.

“A mensagem não muda”

A pastora Lucy, de brinco de argolas, calça jeans preta rasgada e botas com franjas, reforça o intuito de ser uma igreja atrativa para as novas gerações. Por isso, também, investir tanto em música - a primeira meia hora da reunião é praticamente um show, com banda e grupo de cantores.

Show sisterhood - Divulgação/Hillsong - Divulgação/Hillsong
Show de cantora durante evento da Hillsong
Imagem: Divulgação/Hillsong

“Mas a mensagem não muda, só os métodos”, diz Lucy. No livro “The Hillsong Movement Examined” (“O Movimento Hillsong Examinado, sem edição no Brasil), a pesquisadora  Tanya Riches, da Universidade de Sidney, na Austrália, afirma que a Igreja segue valores tradicionais e apoia que mulheres estejam em seus papéis de esposas e mães, mesmo que sejam bem-sucedidas em suas carreiras. Inclusive dentro da Hillsong, onde as líderes do sexo feminino têm tanto poder quanto os homens. E as pastoras, como Bobbie e Lucy, são casadas.