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Conheci meu marido quando ele estava preso e nos casamos na cadeia

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para Universa

17/07/2018 04h00

A motorista Márcia Cordeiro, de 37 anos, encontrou o amor da sua vida na Penitenciária AEVP Jair Guimarães de Lima de Potim, no interior de São Paulo. Ao visitar o irmão, ela conheceu Luciano Cordeiro, de 43, preso, por assalto. Eles começaram a namorar e se casaram no presídio, com direito a tapete vermelho. Nesse depoimento, ela conta sua história:

“Conheci o Luciano durante as visitas que fazia ao meu irmão, o Luis, na cadeia. Eles dividiam a mesma cela. O Luciano se interessou por mim e pediu autorização ao meu irmão para se aproximar. Lá, os presos têm uma disciplina de só poder se comunicar com um visitante de outro detento mediante autorização. Meu irmão consentiu.

No período de visitas, nós conversávamos sobre família, trabalho e amenidades. Com o tempo, o Luciano começou a se declarar para mim por meio de cartas. As coisas que não podia falar na frente do meu irmão, ele escrevia e me enviava pelo correio. No início, eu não correspondi ao interesse dele. Ele era separado e tinha um filho. Já eu, estava recém-divorciada, tinha três filhos e não queria um novo relacionamento. 

Com o tempo, fui me envolvendo com o jeito dele. O Luciano trabalhava na farmácia da cadeia e auxiliava o médico nas consultas. Meu irmão o elogiava, dizia que ele era um homem esforçado e que só precisava de uma nova chance. Dois meses depois de nos aproximarmos, houve uma rebelião e as visitas foram suspensas por 15 dias. Nesse período, senti falta do Luciano e percebi que gostava dele. No reencontro, eu o agarrei e o beijei. Nesse dia, 3 de setembro de 2016, começamos a namorar.

Minha História - Márcia Cordeiro - Beijo - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Vendi minha moto para pagar dois advogados para o Luciano

Com quatro meses de namoro, vendi minha moto para pagar dois advogados para ele. Um trabalharia no divórcio da ex-mulher, e o outro, pediria o regime semiaberto. O Luciano foi preso por assalto e está na cadeia há cinco anos. Fiz isso porque vi futuro na nossa relação.

Vejo o carinho e amor dele por mim nas pequenas atitudes. Eu o visito todos os sábados e domingos. Na sexta, ele faz faxina na cela, lava as paredes, coloca lençóis limpos e cheirosos para me receber. Temos nossa privacidade durante a visita íntima. Os outros presos não recebem visitas e o Luis nos deixa sozinhos.

Fechamos a porta de ferro, puxamos a cortina e ficamos à vontade. Depois que vou embora, ele limpa tudo para o retorno dos companheiros de cela.

Me comunico com o meu marido por meio dos programas de rádio

Além das visitas, eu me comunico com ele através dos programas de rádio. Envio mensagens de texto que são lidas pelos locutores, gravo áudios no WhatsApp e ofereço músicas românticas. Ele fica com o rádio ligado e ouve minhas declarações. É uma forma de expressar meu amor e mostrar a ele o quanto ele é importante para mim.

No dia 24 de maio deste ano me casei no civil com o Luciano, mas sem a presença dele. Oficializamos a união por meio de procuração. Brinco que casei com a Karina Fonseca, diretora do centro de reintegração e atendimento à saúde da penitenciária. Ela representa todos detentos. Eles não puderam ir ao cartório porque não havia como montar uma estrutura de segurança no local. A juíza me perguntou: “Márcia, você aceita Luciano Cordeiro, representado por Karina Fonseca, como seu legítimo esposo? Eu respondi que sim e assinei. Ela fez a mesma pergunta para a Karina e ela assinou.

Quatro dias depois, participei de um casamento coletivo com 32 noivas na penitenciária. Fui na loja em que achei o vestido que queria e falei para a dona: ‘Moça, eu vou casar na cadeia, estou desempregada e preciso de um vestido’. Ela me vendeu a peça de R$ 450 por R$ 220. Usei R$ 100 do bico de motorista que faço de fim semana levando as mulheres dos presos para a cadeia comigo, e peguei parte do salário do seguro-desemprego. Paguei R$ 5 na minha tiara. E comprei um buquê por R$ 25.

Minha História - Márcia Cordeio - brinde - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Casei na cadeia com direito a tapete vermelho e Sprite no lugar de champagne

Apesar do casamento ter sido realizado numa penitenciária, a Karina e sua equipe se esforçaram para transformar o ambiente sombrio num local harmonioso. Estava tudo lindo. Eles colocaram tapete vermelho, um bolo de decoração, arranjos de flores nas mesas, vela perfumada e substituíram o champagne por Sprite para fazermos os brindes com as taças.

As noivas entraram ao som da marcha nupcial. Eu fui a penúltima a casar. O padre fez uma breve cerimônia e nos deu a benção. O Luciano se ajoelhou, colocou a aliança no meu dedo e beijou a minha mão. Fiquei emocionada e feliz, era como se eu estivesse na igreja. Me casar com o Luciano foi o melhor presente que eu poderia receber um dia depois do meu aniversário.

Após a cerimônia, ficamos juntos por 10 minutos, tiramos fotos e depois o meu marido e os outros presos tiveram que voltar para as celas. Ele teve que me devolver a aliança e a roupa que usou.

Queremos abrir um negócio e casar novamente quando Luciano sair da prisão

O advogado calcula que meu marido será solto até maio de 2019. Eu já deixei tudo preparado para quando ele deixar a prisão, ter condições de trabalhar e se reerguer. Com o dinheiro da minha rescisão, já comprei roupas novas, fiz um cartão de visitas, comprei equipamentos e ferramentas para abrirmos uma empresa que prestará serviços de reforma em geral.

Quando ele cumprir a pena, pagar pelo erro que cometeu e sair da cadeia, queremos nos casar novamente para comemorar a liberdade dele e celebrar uma nova fase na nossa vida”.