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Estas mulheres pediram demissão sem ter um plano B, mas não se arrependem

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Letícia Rós e Rita Trevisan

Colaboração para Universa

29/06/2018 04h00

Pressão por resultados, falta de reconhecimento, satisfação zero com o trabalho... Esses e outros motivos fizeram com que estas mulheres tomassem a decisão de dar um tempo na vida profissional, mesmo sem ter um plano B.

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“Sofria muita pressão e já estava sentindo as consequências físicas do estresse”

Ketlyn Gil Carmignoli, 34 anos, psicopedagoga e terapeuta floral - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Imagem: Acervo pessoal

“Trabalhava há sete anos em uma clínica, atendendo crianças e adolescentes com dificuldades escolares. Mas, a cada dia que passava, a pressão aumentava. Todo final de mês minha coordenadora me cobrava pelo aumento no número de atendimentos. Era um ritmo maluco e, além disso, tinha que preencher um monte de relatórios que eu acabava levando para casa. Com o tempo, o estresse me fez ter sintomas de ansiedade generalizada e, depois, de síndrome do pânico. Tinha dores de cabeça, no corpo e problemas gastrointestinais. Eu me lembro de um dia em que estava atendendo um grupo de 11 crianças e, quando percebi, estava gritando com elas. Então, percebi que havia chegado ao meu limite. Conversei com meu marido e fizemos as contas, decidimos tirar as crianças da escola particular para manter as demais despesas só com o salário dele, já que eu não tinha um plano B. Então, chutei o balde, mesmo. Comuniquei minhas companheiras de trabalho e a minha coordenadora da decisão que havia tomado. Agora, faço atendimento particular na área de psicopedagogia e trabalho como terapeuta floral em meu consultório. Não ganho nem 10% do salário que eu ganhava, mas trabalho menos. Posso dizer que estou vivendo meu melhor momento.”

Ketlyn Gil Carmignoli, 34 anos, psicopedagoga e terapeuta floral

“Não tinha perspectiva nenhuma de crescimento e não me sentia valorizada”

Marilia Couto Moratelli, 32 anos, maquiadora e professora - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Imagem: Acervo pessoal

“Eu me formei na área de Letras e sempre busquei meu crescimento profissional. Fiz três pós-graduações e duas extensões universitárias. Mas trabalhava em escola particular e nunca me senti valorizada. Os pais apenas cobravam cada vez mais, colocando nos professores a responsabilidade de educar seus filhos. A coordenação passava mais e mais tarefas, muitas delas precisavam ser feitas fora do horário e aos finais de semana. Os alunos não queriam nada com nada e eu me sentia realmente desperdiçando meu tempo e meu conhecimento. Minha sensação era de que tudo o que eu fazia não tinha valor ali. Eu não tinha perspectiva nenhuma de crescimento. Até que decidi sair da escola, completamente por impulso, no mês de novembro. Podia ter esperado o recesso escolar, mas tomei a decisão e, na mesma hora, comuniquei a direção. Só pensava em tirar férias e descansar. No começo do ano seguinte, decidi dar aulas particulares de português e inglês e, por sugestão da minha mãe, investi também em um hobby que eu tinha, que era a maquiagem. Fiz alguns cursos e, hoje, concilio as duas atividades. Se eu pudesse voltar 12 anos, nem teria investido na educação formal, teria ido direto para essa área da beleza, pois é o que, de fato, me realiza.”

Marilia Couto Moratelli, 32 anos, maquiadora e professora

“Sentia falta de um tempo maior com meus filhos e passava noites sem dormir”

Adriana Fazzi Caldas, 47 anos, administradora e tradutora - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Adriana Fazzi Caldas, 47 anos, administradora e tradutora
Imagem: Acervo pessoal

Trabalhei durante 18 anos em uma multinacional, mas, com o tempo, percebi que era só por dinheiro. No começo, tinha dívidas e, depois, os compromissos com a família e os filhos, que falavam mais alto que a minha realização pessoal. Mas, a cada ano que passava, me sentia mais infeliz. O dia a dia era corrido e eu sempre levava trabalho para casa. Fazia depois que as crianças dormiam ou aos finais de semana de manhã. Com o tempo, além de não me realizar no trabalho, passei a me sentir infeliz como mãe. A rotina era muito cansativa. Eu sentia falta de um tempo maior com meus filhos. Nos últimos tempos, eu já não dormia quase nada, acordava no meio da madrugada e ficava até de manhã, tamanho era o estresse e a preocupação. Tentei mudar de área, mas não consegui. Então, quando aconteceu um programa de demissão voluntária, aderi imediatamente. Conversei com meu marido e chegamos a um consenso:  decidimos que as crianças precisavam de outra vida, a família precisava de outra vida. Eu iria atrás de outra atividade que me permitisse trabalhar de casa e estar mais perto deles. Hoje, faço trabalhos de tradução e revisão de texto e não pretendo voltar a trabalhar fora.”

Adriana Fazzi Caldas, 47 anos, administradora e tradutora

“Não agregava valor ao mundo com o meu trabalho. Tive até crise de ansiedade”

Raquel Souza Bressan, 26 anos, recepcionista - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Imagem: Acervo pessoal

“Fiquei durante quatro anos em agências de publicidade e, embora o ambiente fosse bastante hostil, com diversas manifestações de machismo, por exemplo, o que mais me incomodava era a natureza do trabalho. Eu sempre quis trabalhar pelo bem-estar das pessoas e estava fazendo justamente o contrário: ficava colocando na cabeça delas a necessidade de comprar um produto ou serviço. Não me sentia agregando nenhum valor real para o mundo, sabe? Eu queria ter satisfação pessoal e meu trabalho me dava o oposto disso. A gota d’água foi uma crise de ansiedade, que me fez ficar em casa por uma semana. Foi aí que decidi que era hora de buscar outro rumo, ainda que não soubesse exatamente qual. Conversei com minhas chefes e elas foram muito acolhedoras, me falaram que eu estava certa de pensar em mim e na minha saúde primeiro, isso me deu um certo alívio e mais força para seguir adiante. Então, comecei a pensar no que eu poderia fazer para pagar as minhas contas e mandei alguns currículos para estúdios de tatuagem, pois é algo que eu gosto. Logo me contrataram como recepcionista, assim que terminou meu aviso prévio. Ainda não me encontrei profissionalmente, mas estou dando um tempo para mim, para pensar no que realmente me satisfaz, e também voltei a estudar. Estou me dando uma nova chance e só me arrependo de não ter feito isso antes.”

Raquel Souza Bressan, 26 anos, recepcionista

“Desisti de empreender porque não tinha mais prazer no trabalho e estava ficando doente”

Adriana Ilek, 40 anos, pedagoga - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Imagem: Acervo pessoal

“Fui proprietária de uma escola de educação infantil por 15 anos. Sempre trabalhei com crianças e amava dar aulas, mas, com o passar dos anos, lidar com funcionários e pais de alunos já não era nada prazeroso. Um dos principais motivos que eu tive para desistir de empreender foram os meus filhos, pois eu chegava em casa cansada, nervosa e o tempo com eles, que era para ser gostoso, começou a ser péssimo. Além disso, quando eles ficavam doentes, eu não podia ficar em casa para cuidar, tinha muitos compromissos com a escola. Após as férias de julho, fiquei muito doente e percebi que só de pensar em retornar para a escola eu me sentia mal. Não tinha vontade de trabalhar e os dias começaram a não render. Vivia nervosa e sem paciência. Foi aí que decidi e tive que ser muito forte para conseguir dar um basta e seguir em frente. Resolvi que, em 2018, não trabalharia mais. Coloquei a escola para vender e comuniquei aos pais. Depois, tive que demitir todos os funcionários. Tive muitos gastos com o fechamento da escola, mas deu tudo certo. Hoje, estamos nos adaptando, vivendo apenas com o salário do meu marido. Eu me sinto muito aliviada, como se tivesse tirado um peso das minhas costas.”

Adriana Ilek, 40 anos, pedagoga