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Cytotec: 5 fatos sobre o remédio usado para induzir aborto

O Misoprostol, comumente chamado de Cytotec, é usado para aborto legal no Brasil - Getty Images
O Misoprostol, comumente chamado de Cytotec, é usado para aborto legal no Brasil Imagem: Getty Images

Helena Bertho

da Universa

08/06/2018 04h00Atualizada em 29/10/2022 13h30

Aborto foi um dos assuntos abordados pelos candidatos a presidência no debate de ontem (29) promovido pela Rede Globo. Ambos se dizem contra o procedimento, mas Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acredita que seja uma preocupação de saúde pública, enquanto Jair Bolsonaro (PL) é convicto que o procedimento tem que ser proibido.

Lula então relembrou uma fala de quando ele era deputado, que dizia ser à favor da distribuição de "pílula do aborto" em 1992. Bolsonaro se defendeu dizendo que "abortivo era cytotec" que ele estava se referindo a pílula do dia seguinte, mandando Lula de abortista.

Bastou o atual presidente dizer o nome do medicamento para que as buscas explodissem no Google. Às 22h28 da noite de ontem (29), o termo "citotec" chegou ao nível 100 (e mais alto) de popularidade em buscas de acordo com o Google Trend, ferramenta que monitora os termos mais pesquisados da internet. No mesmo horário, "cytotec", com outra grafia, estava no nível 50 no índice de buscas.

Gráfico do Google Trends sobre a pesquisa de remédio para aborto após o debate  - Reprodução  - Reprodução
Gráfico do Google Trends sobre a pesquisa de remédio para aborto após o debate
Imagem: Reprodução

Conheça a medicação

Toda mulher, ou quase, já ouviu falar do Cytotec e também recebeu um alerta sobre os riscos de usá-lo para fazer um aborto. Hemorragia, aborto malsucedido e má-formação do feto são os perigos mais comumente falados. Mas o que pouco se diz é que o remédio, de comercialização ilegal no Brasil, é recomendado pela Organização Mundial de Saúde como o método farmacológico para um aborto seguro. E também, que é usado no SUS para os casos de aborto legal.

A interrupção de uma gestação no Brasil é crime, a não ser em casos de anencefalia do feto, estupro ou quando a vida da mãe está em risco. Mesmo assim, o Misoprostol (nome da principal substância que compõe o Cytotec) é amplamente usado por mulheres que desejam realizar um aborto. Ciente dessa realidade, Universa conversou com especialistas para desmistificar o medicamento e o uso dele.

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Ele é usado no SUS

O Misoprostol não pode ser vendido em farmácias, nem comprado por pessoas físicas, mas tem seu uso liberado em hospitais autorizados no Brasil. Aqui é produzido pela INFAN (Indústria Química Farmacêutica Nacional) e tem o nome de Prostokos.

Nos hospitais, além do aborto legal, ele é utilizado em dois tipos de indução de partos: o de fetos mortos antes de 30 semanas de gravidez e em gestações em que a mulher não entra naturalmente em trabalho de parto dentro do prazo limite.

É recomendado pela OMS e em qualquer fase da gravidez

A Organização Mundial da Saúde estima que são feitos anualmente 22 milhões de abortos inseguros no mundo. Eles são os responsáveis pelas mortes de cerca de 47 mil mulheres. Para a OMS, essas mortes e outras consequências físicas e mentais poderiam ser evitadas através "da educação sexual, do planejamento familiar e do acesso ao abortamento induzido de forma legal e segura".

Para o aborto seguro, a organização publica um guia com orientações técnicas e políticas públicas de saúde. A última edição é de 2012. Nela, são citadas três formas de realizar abortos com segurança: a aspiração a vácuo intra-uterina, que é um procedimento cirúrgico; o uso combinado de Misoprostol e Mifepristone (que diminui o sangramento e outros sintomas do aborto), e o uso do Misoprostol sozinho.

Nesse manual, a OMS recomenda a aspiração somente até a 12ª de gravidez. Já os medicamentos são recomendados em qualquer fase da gestação, com variação das dosagens. O documento alerta, no entanto, que há poucos estudos clínicos sobre o aborto com medicamentos após a 24ª semana.

Risco de hemorragia é pequeno

O uso do remédio para induzir um aborto pode, sim, provocar uma hemorragia, mas a frequência desses casos é pequena. "Menos de 5% dos casos", explica o geneticista ThomazGallop, professor da Universidade de São Paulo e membro do GEA - Grupo de Estudos do Aborto.

Segundo a ginecologista Maria das Dores Sousa Nunes, que tem um doutorado sobre o assunto, "as mulheres costumam se assustar porque, no aborto, elas sangram muito. Mas a maioria desses sangramentos não significa riscos graves à saúde".

O problema, segundo a médica, é que no Brasil, a mulher tem medo de recorrer a um hospital quando começa a sangrar e não sabe se está tendo uma hemorragia.

Aborto malsucedido e má-formação do feto

O Misoprostol pode falhar. "Entre 5 e 10% dos casos", diz Gallop.

Maria Teresa completa que, mulheres que têm o organismo mais resistente às doses mais indicadas, podem não abortar com o remédio. "No entanto, não se conhece relação entre esse quadro e a má-formação de fetos".

Thomaz Gallop reforça que a maior parte das complicações decorrentes de aborto no Brasil vem de procedimentos feitos sem condições de higiene e em clínicas ilegais.

Trazer, distribuir, vender ou usá-lo pode dar cadeia

Segundo a advogada e pesquisadora do Instituto de Bioética ANIS, Gabriela Rondon, se pega com o remédio, a mulher pode ser enquadrada em um tipo de crime contra a saúde pública, cuja pena vai de 10 a 15 anos de prisão e multa. "Há juízes que enquadram como tráfico, crime que tem pena mais baixa". Nesse caso, de cinco a 15 anos.

Já a mulher que for denunciada pelo uso do medicamento comete o crime de autoaborto, que dá pena de um a três anos de cadeia. "Mas esse é um crime de difícil comprovação. O que acontece é que os médicos suspeitam que ela fez o aborto e a denunciam", acrescenta Gabriela.