Topo

É preciso mulheres eleitas, e não candidatas figurativas, diz pesquisadora

Luciana de Oliveira Ramos, professora e integrante do Grupo de Pesquisa em Direito e Gênero da FGV - Divulgação/FGV
Luciana de Oliveira Ramos, professora e integrante do Grupo de Pesquisa em Direito e Gênero da FGV Imagem: Divulgação/FGV

Daniela Carasco

do UOL, em São Paulo

11/01/2018 04h00

Em ano de eleição e em tempos de debates acalorados sobre direitos das mulheres, prestar atenção à presença feminina na política é fundamental. Luciana de Oliveira Ramos, professora e integrante do Grupo de Pesquisa em Direito e Gênero da FGV, fala que a sub-representação é preocupante no Brasil e um enorme empecilho para que políticas públicas, que atendam às necessidades das brasileiras, de fato, sejam implementadas.

Os números confirmam o problema. Cerca de 51,48% da população brasileira e do eleitorado é composta por mulheres. Porém, quando o olhar se volta para os cargos eletivos proporcionais, aqueles ocupados na Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmara do Vereadores, o que se vê é que de um total de 513 deputados, apenas 51 são delas. E mais: No mundo, o Brasil ocupa a 155ª posição, das 189, no ranking da ONG União Interparlamentar, que mede a quantidade de mulheres nas casas legislativas federais.

“Esses ambientes são uma espécie de arena de discussão da sociedade, mas não a representa proporcionalmente. Por isso, é importante eleger mulheres nas eleições deste ano", diz. Presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual são os cargos que entram na disputa de 2018.

Veja também:

Onde está a raiz da sub-representação?

Para a professora, o maior causador desse problema são as estruturas partidárias viciadas. “Não existe nenhum estímulo dos partidos políticos para que as mulheres participem da política nacional”, diz. 

A única exigência é que os partidos, individualmente ou enquanto coligação, cumpram uma cota mínima de 30% de candidatura feminina. “Só que muitos acabam tratando essa porcentagem como teto e não incentivam de fato que essas mulheres sejam eleitas.”

Luciana faz parte do comitê de políticas do grupo Mulheres do Brasil, composto por figuras femininas importantes das mais variadas áreas de atuação para discutir e propor ações ligadas à educação, empreendedorismo, cotas e projetos sociais. Luiza Trajano, do Magazine Luiza, é uma das líderes. Dentre as realizações da associação está um software para monitorar o cumprimento dos 30%. E o que se descobriu com ele foi a existência de “mulheres invisíveis”. 

“Existe no país muitas candidaturas figurativas”, explica. “Os partidos acabam selecionando nomes que têm poucas chances nas urnas, só para que o TSE aprove a chapa e ele possa disputar a eleição.” Por isso, as poucas líderes que conseguem conquistar uma posição política relevante, em geral, são filhas de alguém da área ou têm bom capital econômico para sustentar sua própria candidatura.” Luciana defende, portanto, que as cotas se estendam à reserva de assentos no legislativo.

Urna eletrônica, eleição, eleitoral, votação, sufrágio, pleito, candidato, campanha eleitoral - Alan Marques/Folhapress - Alan Marques/Folhapress
Imagem: Alan Marques/Folhapress
Mas, afinal, por que é importante ter mais mulher na política?

“A presença feminina é fundamental para fazer as novas leis servirem definitivamente para toda a população”, diz Luciana. “Não faz mais sentido que homens brancos, heterossexuais e com mais de 50 anos criem regras para uma sociedade que está mudando e não corresponde mais com a sua visão de mundo. As mulheres oferecem outras perspectivas em um lugar que deveria representar o debate público.”

Assuntos como aborto, violência doméstica, assédio e estupro são alguns dos que exigem, segundo ela, uma participação feminina para a tomada de novas decisões. “Os homens não têm a dimensão do que é ser assediado, por exemplo. São elas que vão fazer as políticas públicas para mulheres avançarem.”

Votar em qualquer mulher resolve?

A especialista defende como fundamental votar em uma candidata com plano de governo favorável às causas femininas. “Enquanto estamos mal numericamente, pensar em uma representatividade substantiva é um segundo passo.”

A sugestão da pesquisadora é que se vote, de qualquer maneira, em ao menos uma mulher nas próximas eleições, para que os homens comecem a respeitar a presença feminina na política. “Esse também é um espaço delas.”

Ainda há uma resistência delas em se candidatarem?

Encarar um ambiente majoritariamente masculino não é tarefa fácil. “Já conversei com algumas candidatas e eleitas que são desacreditadas a todo momento”, conta. “Os obstáculos vêm não só da sociedade, que julga principalmente mulheres jovens e bonitas nessas funções, como dos próprios políticos. Elas são assediadas o tempo todo lá dentro. A falta de estímulo é completa. Mas é preciso encarar. Precisamos construir uma base feminina, para que não sejam mais vozes isoladas. Depois, se lapida.”