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Na China, clube oferece treinamento para transformar "meninos em homens"

Kim Kyung-Hoon/Reuters
Imagem: Kim Kyung-Hoon/Reuters

15/11/2018 08h45

Com inspiração em filmes repletos de estereótipos do "macho tradicional", dezenas de meninos na China são submetidos a um rígido treinamento militar para se transformarem em "homens de verdade" - que, para os defensores deste método, significa não ser sensível, saber lutar e ser forte - e escaparem assim de uma suposta "crise de masculinidade".

Muitos pais enviam ao "Clube dos Meninos", uma escola na cidade de Qinhuangdao, no leste do país, os filhos de 5 a 12 anos de idade para que aprendam hábitos cotidianos como lavar roupa e dobrar os lençóis e levem uma vida mais saudável, deixando de lado os videogames e praticando mais esporte.

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O método utilizado por esta escola se baseia na disciplina militar: correr sem camisa no inverno, escalar montanhas e aprender a brigar aos gritos de "Quem somos? Somos homens".

Esse é o lema da escola, fundada há seis anos para combater uma suposta falta de masculinidade dos meninos chineses.

"Atualmente eles são mais femininos, com muito sentimento e tristeza", disse Jing Jing, uma das professoras, à Agência Efe.

"Na China, normalmente as mães cuidam dos meninos, e quando eles vão para a escola, a maioria dos professores é de mulheres, e elas não conseguem entendê-los tão bem", comentou a educadora.

Por isso, neste clube, eles recebem um treinamento militar que os ensina a lutar, "embora a segurança das crianças esteja garantida, para que elas não fiquem feridas", ressaltou Jing.

Usando luvas de boxe, os professores ensinam os garotos a mostrar sua virilidade através da força e sem choro.

"Algumas lágrimas merecem respeito. E outras não", afirmou com contundência a professora, que argumenta que, embora seja bom expressar sentimentos "normais", como alegria e tristeza, os meninos têm que aprender que não conseguirão nada com choramingos.

Na China, os meninos que choram ou não mostram o caráter através da força são tachados frequentemente de serem "femininos demais" em uma sociedade tradicional, na qual geralmente se reprime a expressão das emoções e dos sentimentos.

Zhang Wujun, um dos pais que decidiu enviar o filho, de 11 anos, para este local, se mostrou encantado com os resultados obtidos, já que agora o menino pratica mais esporte e controla melhor os sentimentos.

"Antes ele era mais gordinho, mas agora emagreceu, porque faz mais esporte", disse Zhang à Efe.

Ele alardeia que agora seu filho é "mais homem", porque estuda em um colégio longe de casa e tem se adaptado mais rápido que os colegas, que sentem saudades de suas famílias e choram por telefone.

"Os homens não devem chorar sempre", ressaltou.

O sucesso da escola é indubitável: a cada ano recebe mais de 2 mil meninos em diferentes cursos - alguns durante os finais de semana, e outros durante as férias - que não custam menos de 5 mil iuanes (cerca de R$ 2.700).

No entanto, os rígidos métodos são questionados por alguns especialistas, que consideram que a verdadeira crise que afeta a sociedade chinesa é a incapacidade dos pais de educar os filhos, e assim recorrem a este tipo de lugar para que lá os garotos adquiram comportamentos e hábitos que deveriam aprender em casa.

"Honestamente, acredito que o que precisamos são acampamentos para formar os pais antes que tenham filhos", opinou à Efe Peggy Liu, que lidera um programa sobre ensino de hábitos saudáveis em colégios e shoppings de todo o país.

A pressão e o nível de exigência ao qual são submetidos os menores nestes locais "podem afetar sua saúde mental", alertou Liu, que insiste que "é possível construir a masculinidade sem ensinar um comportamento agressivo".

Para ela, o segredo para combater a obesidade, o choro e a falta de iniciativa das crianças é o amor próprio, e o que realmente elas devem aprender é como se relacionar com as pessoas.

Quando questionada se os jovens se divertem no "Clube dos Meninos", a professora reconhece que o ambiente é "um pouco duro, porque não há muitos conteúdos divertidos".

"Mas os meninos não vêm aqui para se divertir, e sim para serem mais fortes", concluiu.