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Cirurgia plástica vira moda na Coreia e gera contos de terror na Justiça

Stephen Evans

Da BBC, em Seul

17/12/2014 15h48

É impossível não notar os anúncios. Em qualquer lugar que você for em Seul, capital da Coreia do Sul, há um deles dizendo que você deveria mudar seu rosto ou seu corpo com uma cirurgia plástica. No conhecido distrito de Gangnam, a impressão é de que todos os muros têm alguma mensagem promovendo uma cirurgia dessas. No trem e na rua, você é convidado a dar "nova vida a seu rosto". "Contorno facial" é outra oferta comum, assim como a cirurgia para colocar silicone nos seios, ou um ajuste para acabar com os "pés de galinha" no rosto com botox ou ainda uma cirurgia para afinar a cintura. Outros anúncios oferecem a "redução do queixo quadrado" (principalmente para os homens). Ou prometem transformar o seu rosto "de caído e flácido para firme e proporcional", voltado principalmente para as mulheres.

Uma conhecida minha reclama que o queixo dela se torna doloroso quando chove. Mas logo eu descubro que ela queria fazer uma cirurgia plástica no nariz, mas foi convencida - ou convenceu a si própria --de que era seu queixo que realmente precisava de novos contornos. O resultado: um queixo mais bem feito que é também um queixo mais doloroso. Apesar disso, ela já planeja uma nova intervenção cirúrgica para aumentar os seios.

Presente para a filha
Na Coreia, pais me contam que é comum eles presentearem suas filhas adolescentes como uma "cirurgia de pálpebra dupla", que muda o formato dos olhos para elas parecerem "menos asiáticas". Por que, eu me pergunto, se os olhos coreanos são tão bonitos do jeito que são?

A mensagem que ecoa dos anúncios no trem é que "confiança na aparência traz energia positiva que pode ser a essência da felicidade". Felicidade, essa coisa tão simples que pode ser conquistada com o corte de uma faca! Exceto pelo fato de que não é bem assim. Existe agora uma reação em forma de ações na Justiça – em grande quantidade – movidas por pacientes, ou melhor, vítimas, processando médicos que refizeram seus rostos, mas não da forma correta. Uma das vítimas disse que, quando tirou os curativos, "não parecia ter um rosto humano...que seu rosto era mais repulsivo que o de monstros ou alienígenas".

Parte do problema é que a cirurgia plástica é tão lucrativa que médicos não qualificados para isso – ou mesmo médicos que são de outras áreas da medicina – estão se aventurando nessa especialidade. Há relatos de procedimentos cirúrgicos estéticos sendo realizados por chamados "médicos fantasmas". Em um dos casos que foi parar na Justiça o processo diz que o médico responsável saiu da sala quando o paciente estava sob anestesia, e que outro médico o substituiu e cometeu falhas no procedimento.

Além disso, em alguns casos, fotos do "antes e depois" dos pacientes usados em anúncios também passaram por uma "cirurgia" – no caso, aquela feita pelo Photoshop.

Como consequência disso, a Associação Coreana de Cirurgiões Plásticos está pedindo regras mais rígidas para médicos da área e também para a publicidade relacionada a esse tipo de cirurgia. Eles temem que a má publicidade gerada com esses casos prejudique a reputação de uma indústria que é, em sua maior parte, bem administrada.

Mas eles estão remando contra a maré. A cirurgia plástica é uma atividade extremamente rentável na Coreia do Sul, mesmo com preços mais baixos do que nos EUA e na Europa. Em uma das grandes empresas em Gangnam, aqui em Seul, uma correção do formato do olho, procedimento que dura aproximadamente 30 minutos, custa US$ 1.500 (ou R$ 4.000). Já uma cirurgia para tirar as rugas pode custar cerca de US$ 11.000 (ou R$ 29.540).

Vaidade chinesa
É importante chamar a atenção para esse fato, porque já há um grande mercado com o mesmo "senso de vaidade" da Coreia crescendo na vizinhança --a China. De acordo com o jornal Joogang Daily, dois terços dos estrangeiros que visitaram a Coreia do Sul no ano passado para fazer uma cirurgia plástica vieram da China -- o que significa mais de 16 mil clientes. A imprensa local relata que algumas das cirurgias plásticas feitas por chineses são tão radicais – e "bem feitas" – que às vezes causam problemas para as autoridades na hora de a pessoa sair do país.

Mas talvez os chineses que sonham com uma beleza de atriz/ator de cinema, ou mesmo os pais sul-coreanos que acham que podem melhorar o visual de suas filhas presenteando-as com uma plástica deveriam refletir sobre as chances de acabarem vivendo um conto de terror na Justiça por conta de um procedimento malfeito.

Uma ex-rainha da beleza do país se submeteu a um procedimento para aumentar os seios com silicone, mas a cirurgia deu terrivelmente errado. Depois de uma série de infecções, ela terminou com uma mama muito maior do que a outra. Ela culpa os médicos pelo desastre, mas também por nunca terem dito a ela: "Olha, você não precisa disso." "A cirurgia plástica é como um vício", disse ela. "Se você fizer os olhos, você quer o nariz". "E os médicos não dizem: 'Você é bonita o suficiente como você é'."