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Caso de irmãs parricidas mostra como Rússia lida com violência doméstica

Angelina Khachaturyan, uma das três irmãs acusadas de matar o pai, no tribunal em Moscou - Yuri KADOBNOV/AFP
Angelina Khachaturyan, uma das três irmãs acusadas de matar o pai, no tribunal em Moscou Imagem: Yuri KADOBNOV/AFP

Da AFP, em Moscou

26/06/2019 17h57

O caso de três jovens que serão julgadas pelo assassinato de seu pai, a quem haviam denunciado reiteradamente por surras e agressões sexuais, causou estupor na Rússia, onde os ativistas lamentam a indiferença das autoridades ante os casos de violência doméstica.

À espera do processo, um tribunal moscovita prolongou nesta quarta-feira (26) a prisão domiciliar para Krestina, Angelina e Maria Khachaturyan, acusadas de ter planejado juntas o assassinato de seu pai, Mikhail, em julho de 2018. Tinham então 19, 18 e 17 anos respectivamente.

As irmãs podem ser condenadas a até 20 anos de prisão. Seu advogado defende que agiram em legítima defesa. Associações de proteção dos direitos das mulheres lutam para que as jovens sejam assistidas psicologicamente, em vez de presas.

As irmãs Khachaturyan foram espancadas "praticamente todos os dias" por seu pai, que abusava sexualmente delas regularmente, quando não atirava contra elas com uma pistola de ar comprimido, explicou à AFP seu advogado, Alexei Liptser.

Vizinhos e familiares avisaram a polícia, que não levou o caso a sério, como é habitual na Rússia. Segundo Liptser, Mikhail Khachaturyan tinha contatos nas forças de segurança.

Depois de que Krestina tentou se suicidar em 2016 e de que seu pai utilizou gases lacrimogêneos contra elas, as três se convenceram de que "se não agissem, uma delas morreria", afirmou seu advogado. Assim, um dia, quando o pai estava dormindo, desferiram-lhe dezenas de punhaladas.

O caso das irmãs Khachaturyan despertou uma onda de indignação na Rússia, onde algumas formas de violência no círculo familiar foram despenalizadas em 2017.

"As meninas vivam um inferno. Salvaram sua vida porque sabiam que ninguém podia ajudá-las: nem a polícia, nem os vizinhos, nem seus professores", indicou à AFP Anna Rivina, diretora de um centro de ajuda jurídica para vítimas de violência conjugal.

"O Estado não reconhece a violência doméstica contra as mulheres e não existe nenhum mecanismo jurídico para protegê-las", acrescentou.

Mais de 160.000 pessoas assinaram uma petição para que as irmãs Khachaturyan sejam libertadas e houve manifestações de apoio em frente à sede da Procuradoria e do tribunal.

Aliona Popova, ativista pelos direitos das mulheres destacada na Rússia, considerou que se as jovens forem declaradas culpadas, isto poderia ter consequências "catastróficas".

"Haverá mais mortos", advertiu, afirmando que a sentença servirá para ver se "o Estado apoia os agressores ou as suas vítimas" e que estabelecerá um precedente para outros casos.