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Ela sofre preconceito por causa da religião: "Amor macumbeiro é quase raro"

Jade pratica o Candomblé e a Umbanda há alguns anos, e sempre passa por intolerância religiosa - Fernando Podolski/Getty Images
Jade pratica o Candomblé e a Umbanda há alguns anos, e sempre passa por intolerância religiosa Imagem: Fernando Podolski/Getty Images

Luiza Souto

Da Universa

24/04/2019 04h00

A taróloga Jade Letícia, de 19 anos, pratica religião de matriz africana como candomblé e umbanda há alguns anos. Ama o que faz, e por isso aprendeu desde cedo a não absorver comentários negativos contra sua crença.

Alguns homens com quem já se relacionou, por exemplo, acharam que ela faria alguma espécie de "amarração" ou "feitiço" para segurá-los. Pensam ainda que Jade está sendo punida por ficar no terreiro, mesmo que ela diga que aquilo faz bem para ela. Solteira, explica a dificuldade que mulheres encontram em se relacionar por causa da sua crença.

"Um dos maiores absurdos que escuto sobre a minha religião é que provavelmente eu vou para o inferno, porque fico cultuando vários demônios. Também falam que eu mato animais por eles. Alguns veganos dizem ainda que sou menos evoluída por causa da sacralização de animais, sendo que é uma ceia e todo mundo come. Então são intolerâncias a todo tempo, com opiniões e brincadeiras.

Minha religião não é cristã, mas nós cremos em Cristo e o chamamos de Oxalá. Temos um Deus sincretizado como Nzambi, do Candomblé Angola. Fazemos homenagens com cânticos, danças e alimentos.

É difícil ter um relacionamento porque as pessoas acham que eu faço amarração. E quando falo que sou taróloga, piorou. Acham que se estou com alguém foi porque fiz um trabalho. A religião não prega a amarração. Ao contrário: pregamos que não se deve obrigar a amar ninguém e nem nada.

É quase raro um amor macumbeiro porque dentro do terreiro a gente cria uma família. As pessoas as quais temos acesso ou são casadas ou são tão a sua família que não dá para acontecer nada. De fora, ouço muito que o que eu faço é do mal, é feio. Sempre tem um "não tenho nada contra, mas...". Aí vem algo preconceituoso depois.

A maior dificuldade está em fazer a pessoa entender e acompanhar meu ritmo. O Candomblé tem muito trabalho, às vezes de segunda a sábado. Além disso, tenho preceitos. Não posso sair sempre, por exemplo. E quando estou numa obrigação com o meu santo, eu tenho que usar branco na rua, com guia, então é difícil achar alguém que se disponha a andar comigo dessa maneira sem sentir vergonha, medo ou constrangimento.

Um cara perguntou o que eu fiz para chegar a esse estado, porque relacionou a algo negativo. Achou que eu sofria por conta da minha religião. As pessoas acham que é punição passar um dia inteiro num terreiro, quando na verdade eu quero isso para mim.

Talvez seja melhor nos relacionarmos com quem segue a mesma religião. Nem todo mundo é intolerante, mas ter alguém que se identifica e está ali dividindo esse tempo é um processo de aprendizado e evolução. É um conselho que minha mãe de santo dá e eu também passo para outras pessoas não ficarem se desgastando.

Mas outro importante conselho é parar de demonizar tanto e pesquisar sobre o tema. Eu tenho um amor gigante pelo que eu faço e muita paciência para explicar isso para as pessoas. É só me perguntar.