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Neta de lavadeira, ela estará no G20 feminino: "Quero mais negras no poder"

A baiana Aniele Berenguer vai participar do Girls 20, em maio, no Japão - Arquivo pessoal
A baiana Aniele Berenguer vai participar do Girls 20, em maio, no Japão Imagem: Arquivo pessoal

Camila Brandalise

Da Universa

23/04/2019 04h00

A cúpula do G20, grupo que reúne as 20 maiores economias do mundo, entre elas a brasileira, vai se reunir em junho, no Japão, em um encontro que, anualmente, atrai holofotes do mundo todo. O representante do Brasil deve ser o presidente Jair Bolsonaro.

Um mês antes, em maio, a mesma organização vai reunir 20 jovens mulheres dessas mesmas nações para o encontro Girls 20, criado para estimular o desenvolvimento de jovens líderes femininas. Nesse evento, a baiana Aniele Berenguer, 22 anos, vai representar o Brasil.

Estudante de Psicologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia), Aniele foi escolhida pela organização por causa de sua história de vida e pelo projeto que apresentou. A intenção do Girls 20 é que as participantes possam implementar a ideia desenvolvida na volta a seus países.

A de Aniele é tão simples quanto importante: fazer com que as escolas brasileiras recebam um mínimo de livros infantojuvenis com protagonistas negras. "A partir disso, falar não só sobre racismo como também sobre perspectiva de futuro, mostrar as possibilidades de carreira para essas garotas", diz. "Meu sonho é ver mais mulheres negras em posições de poder: diretoras, CEOs, políticas. É uma questão urgente no Brasil."

A neta da lavadeira chega à faculdade

Neta de uma lavadeira e de um mestre de obras, ela diz que ouviu dos avós maternos, desde muito cedo, que deveria entrar para a faculdade. E foi o que ela fez: em 2017, aos 20 anos, ingressou no curso de Psicologia da UFBA.

Em sua infância, Aniele se lembra de ter lido apenas um livro em que a protagonista era uma mulher negra. Ao longo da vida, continuou não vendo pessoas "como ela" nos lugares que frequentava. Foi assim na escola e na faculdade.

Aos 7 anos, conseguiu uma bolsa de estudos em uma escola particular de Salvador depois que a mãe, massoterapeuta e vendedora informal de acessórios femininos, escreveu uma carta para o colégio pedindo ajuda. "Ela contou que era o sonho de infância dela estudar lá, mas não tinha condições. Queria que a filha tivesse a oportunidade que não teve. Uma semana depois, nos procuraram com a notícia da bolsa", diz.

Naquela mesma época, a mãe, aos 40, começou a estudar Pedagogia. O pai, operador de telemakerting, passava 12 horas no trabalho. "Lembro bem da cena da minha mãe me ensinando a ir sozinha, de ônibus, para a escola, porque ninguém poderia me levar", conta Aniele. "Era difícil, não tínhamos suporte, mas eles insistiam muito na minha educação."

Em Harvard, ao lado de Luciano Huck

aniele berenguer - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Em painel em Harvard, Aniele falou sobre sua história e sobre racismo no Brasil
Imagem: Arquivo pessoal

Aniele esteve em Harvard, no início de abril, em uma conferência anual organizada por brasileiros que estudam na instituição. Ela participou do painel de abertura, apresentado por Luciano Huck, contando sua histórias de vida e seus projetos atuais.

"Lá falei também que a pobreza, no Brasil, tem cor. Que me choco toda vez que não vejo negros ao meu lado nos espaços que ocupo", diz. "Esse deveria ser um incômodo de todos os brasileiros."

Agora, os preparativos estão focados na viagem para o Japão. "Vou encontrar jovens mulheres atuantes em seus países. Cresci sem referências poderosas femininas. Não que elas não existissem, mas não as conhecia. Então, o encontro vai ser importante para ver mulheres com força de liderança."