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"Minha filha de 15 anos tem Síndrome de Down e é uma modelo talentosa"

Georgia tem 15 anos e é modelo - Reprodução/Instagram
Georgia tem 15 anos e é modelo Imagem: Reprodução/Instagram

Bárbara Therrie

Colaboração para Universa

17/03/2019 04h00

Sem notar nenhum traço diferente, a jornalista e dona de casa Rubia Furlan Traebert, 44, só ficou sabendo um dia após o nascimento de Georgia Furlan Traebert que ela tinha Síndrome de Down. Ela ensinou a filha a viver de forma positiva com a condição para ela se desenvolver uma criança confiante. A seguir, Rubia fala sobre a carreira de modelo da menina, que hoje tem 15 anos, contrato com cinco agências e 80 mil seguidores no Instagram.

"Eu morava em Boston, nos Estados Unidos, quando engravidei da Georgia. Com quatro meses de gestação, voltei para o Brasil, dei continuidade ao pré-natal e nenhum exame sinalizou que ela teria algum tipo de deficiência. Quando ela nasceu, eu a vi, peguei no colo, amamentei e não percebi nada de diferente. Ela não tinha os traços característicos perceptíveis. Só no dia seguinte ao parto, a médica falou para mim e para o meu marido, o Herman, que a nossa filha tinha Síndrome de Down. Foi um baque, ficamos chocados e choramos. Após nos acalmarmos, nos olhamos e falamos: 'ela é fruto do nosso amor, independentemente do que ela tenha, nós vamos amá-la e cuidar dela'.

Na época, eu não conhecia ninguém próximo com o mesmo caso, mas pelo pouco que eu sabia, achava que muitas pessoas só viam o lado ruim da condição, eu não queria transmitir essa mensagem para a minha filha. Eu decidi que ia seguir o meu coração de mãe, e ensiná-la a viver de forma positiva com a síndrome, trabalhar na autoestima para ela se desenvolver uma criança segura e confiante. Queria, junto com ela, escrever uma história de vida mais alegre, colorida, menos sofrida e dramática.

Georgia sente orgulho de ter Síndrome de Down

rubia georgia minha história - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Rubia posa ao lado da filha: "Além de mãe, virei produtora, assessora e fotógrafa dela"
Imagem: Reprodução/Instagram

Quando ela ficou mocinha, eu expliquei o que ela tinha, falei que ela era especial e era diferente das outras meninas e meninos, mas que isso não a impediria de nada, ela poderia fazer o que quisesse, só que mais devagar. Ela respondeu que não se sentia diferente e teve uma boa aceitação. Uma vez, durante um ensaio, uma fotógrafa comentou como ela era linda e nem parecia que ela tinha Síndrome de Down, como se ter isso fosse algo negativo. Ela retrucou dizendo que tinha, sim, e com orgulho.

Na minha adolescência, fui modelo de passarela e participei de alguns concursos de beleza. Quando engravidei, dizia que se tivesse uma menina, gostaria que ela fosse modelo. Ao descobrir que a Georgia tinha Síndrome de Down, pensei que isso não ia acontecer, mas me enganei. Ela acabou recebendo essa minha influência porque sempre me viu maquiada e bem-vestida. Desde criança, ela é bastante vaidosa. Eu a arrumo com todo o capricho para exaltar a beleza dela, porque, infelizmente, pessoas como ela sofrem discriminação por causa da aparência e das próprias limitações motoras e intelectuais.

Prova desse preconceito é que eu tentei matriculá-la em alguns colégios particulares regulares, mas eles afirmavam que não tinham vaga ou alegavam que não estavam preparados para recebê-la. Após muitas buscas, consegui colocá-la em uma escola e hoje ela está no nono ano.

Situações como essa me deixavam frustrada, mas nunca transpareci isso na frente dela. Dentro de casa, procurava estimulá-la diariamente. Comprei um karaokê, cantávamos, dançávamos e desfilávamos juntas. Quando ela completou 12 anos, eu a inscrevi em um projeto, onde ela foi selecionada por sete agências de atores e modelos. Dessas sete, ela fechou contrato com cinco.

Eu percebi que minha filha tinha talento e era fotogênica. Comecei a tirar várias fotos e a postar no Facebook. Em 2016, publiquei uma imagem com a legenda: 'Modelo brasileira com Síndrome de Down'. Eu fiz a publicação de forma despretensiosa, sem nenhuma ambição profissional, a ideia era inspirar outras crianças com a mesma condição. Para a minha surpresa, a foto teve quase 40 mil curtidas, muitos compartilhamentos e ela ganhou vários seguidores.

A Georgia pegou o gosto pela área artística, e, a partir daí, passamos a apostar na carreira dela como modelo comercial no Instagram. Além de mãe, virei produtora, assessora e fotógrafa dela. Eu que lavo e escovo o cabelo dela, faço maquiagem, escolho o look, oriento nas poses, tiro a foto e publico. Eu tenho o cuidado de fazer uma produção adequada à idade dela, sem deixá-la vulgar e não submetê-la a uma exposição negativa.

A Georgia ama essa rotina, é incrível como ela se transforma em frente à câmera fotográfica. Ela gosta do que faz, não tem vergonha, fica completamente à vontade. Ela abre o sorrisão e diz que é feliz, linda e poderosa com Síndrome de Down. Ela nasceu com o dom de fotografar.

Já tentaram assediá-la

Atualmente, ela tem 80 mil seguidores no Instagram (@georgiafurlan.oficial) e o fruto da nossa parceria rendeu dois importantes trabalhos. Ela participou de um comercial focado em diversidade para uma rede de roupas. E fotografou para um catálogo de joias de uma renomada designer brasileira. Ele já fez curso de modelo, e hoje em dia faz aulas de canto e teatro. Nas horas vagas, ela adora andar de patins, ficar no parquinho com as amigas, escrever e ler. Mesmo com 15 anos, ela ainda tem um lado criançona e mais ingênuo, e nós incentivamos isso.

Eu administro as redes sociais dela e sou bem cautelosa e seletiva com cada que foto que divulgo. A maioria das pessoas reconhece o talento dela, mas já li alguns comentários racistas e preconceituosos que me deixaram triste. Já afirmaram que é fácil ela ser bonita sendo loira e de olhos azuis, mas queriam ver se ela fosse negra... Outros já tiraram sarro por ela ter a síndrome e também já recebi várias solicitações de amizade de homens mal-intencionados tentando assediá-la. Imediatamente eu os bloqueio.

A Georgia não pode ver um palco que quer subir para falar, cantar, interpretar e fotografar. Tenho que segurá-la, porque senão ela dá show. Ela é fã da Larissa Manoela, e diz que o maior sonho é ser atriz, fazer novelas e deslanchar como modelo. Enquanto esse for o desejo dela, nós vamos apoiá-la. Se um dia ela se cansar e quiser estudar e atuar em outra área, ela terá o nosso incentivo. O importante para nós é ela ser feliz. Nós respeitamos as vontades e decisões dela.

Diariamente eu falo para ela que a vida é dura para quem é mole e que ela é capaz e pode tudo mesmo com a Síndrome de Down, mas, para isso, ela terá de lutar e batalhar. O caminho pode ser um pouquinho mais longo e difícil, mas ela vai chegar. Ter essa condição não é ruim, mas faz dela uma menina especial".