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Por que insistir no beijo como Maycon, do BBB, é violento com a mulher

Maycon tenta beijar Isabella na festa Neon - Reprodução/Globoplay
Maycon tenta beijar Isabella na festa Neon Imagem: Reprodução/Globoplay

Ana Bardella

Colaboração para Universa

18/02/2019 18h58

Na última festa do Big Brother Brasil, o participante Maycon, envolvido em diferentes polêmicas dentro do reality, teve novamente seu comportamento questionado pelo público. Ele passou boa parte da noite tentando se reaproximar de Isabella: os dois se envolveram brevemente no início do programa, mas romperam após desentendimentos. Arrependido da forma como a história se desenrolou, o mineiro vem pedindo para que a estudante de Medicina lhe dê uma nova chance. 

O que não agradou a todos, no entanto, foi a maneira como decidiu abordá-la. Enquanto os dois dançavam, Maycon pediu para lhe beijar em diversos momentos e em todos eles a resposta foi negativa. Isso não o impediu, no entanto, de tentar roubar um selinho de Isabella e de continuar se aproximando fisicamente dela, fazendo-a virar o rosto repetidas vezes. Por fim, quando percebeu que suas tentativas não estavam surtindo efeito, reclamou para Tereza que ela "estava se fazendo de difícil". 

Cenas como as que foram exibidas no programa são comuns em festas: homens se aproximando de forma expansiva e mulheres tentando se esquivar. Com a aproximação do Carnaval, o assunto tem ficado ainda mais em vidência: qual o limite entre assédio e cantada?

Consentimento é a palavra-chave

"Quando um homem insiste em beijar uma mulher mesmo depois de escutar que ela não quer, isso pode ser considerado assédio", aponta a psicóloga Michele Silveira. De acordo com a profissional, no assédio existe uma insistência que beira a agressividade e que pode gerar medo.  

Naiara Mariotto, psicóloga e especialista em sexologia, complementa: "O assédio causa incômodo. Usar palavras baixas, encostar no corpo sem permissão ou resumir a mulher a um objeto sexual são alguns dos exemplos", afirma. 

Na sua visão, o que separa uma cantada ou elogio de um comportamento inaceitável é o consentimento. "A cantada é leve, gostosa. Eleva a autoestima, seduz e até diverte. Gera curiosidade de conhecer o outro e conversar mais. Não gera estragos físicos e emocionais, não traz medo, nojo ou raiva. Já o assédio é agressivo. Ele sempre está acompanhado de algum tipo de poder, tal como o poder físico, e desperta desejo de fuga", resume. 

Reações negativas diante da rejeição

"Certa vez uma das minhas pacientes contou que estava com as amigas em um baile de carnaval quando foi abordada por um rapaz que tentou beijá-la. Quando negou, foi agredida, como se tivesse feito algo contra ele, ferindo assim a sua masculinidade", conta Michele. Para a psicóloga, reações negativas por parte dos homens diante de uma rejeição estão enraizadas na cultura machista. 

"Ao receber um não, questões sociais são levantadas. Algumas construções culturais que vigoram há séculos colocam os homens como seres 'naturalmente superiores', o que lhes conferiria o direito de dominar as pessoas do sexo feminino. Quando um homem se enxerga como provedor, também acredita que é ele quem decide quando e como as coisas irão acontecer", completa Naiara. 

Parte da cultura do estupro

"Para entender a cultura do estupro, é imprescindível nos livrarmos do estereótipo de que o estuprador é aquele homem escondido em um canto escuro e pronto para dar o bote. Estupradores também podem ser homens que tiram vantagens de mulheres desacordadas, que tomam o silêncio como um sim", pontua Michele. A profissional ainda reforça que estupro é crime, mas estupradores não são, necessariamente, pessoas doentes. 

"O que influencia para que o crime aconteça de maneira tão recorrente são as noções culturais sobre o papel feminino e o masculino na sociedade. Muitas vezes enxergamos as mulheres como desfrutáveis, o que acaba sendo nocivo", garante. Em sua visão, desrespeitar o não de uma mulher colabora para que esse pensamento seja perpetuado. Logo, situações de assédio, como insistir em um contato sexual ou deslegitimar o "não" de uma mulher, influenciam no pensamento coletivo de que seus corpos são objetos e que podem ser usufruídos.