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Simone Tebet: "Na política, mulher tem que chegar empurrando a porta"

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) - Reprodução/Facebook
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) Imagem: Reprodução/Facebook

Camila Brandalise

Da Universa

15/02/2019 04h00

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) acaba de assumir a presidência da CCJ (Comissão de Cidadania e Justiça), grupo de parlamentares que trata dos temas mais importantes que tramitam no Senado, caso, neste começo de mandato, da reforma da previdência e da redução da maioridade penal, por exemplo.

Simone, que foi uma das protagonistas da humilhação política pelo qual passou o ex-presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), ao perder a reeleição, diz que tem a pauta feminina como sua "menina dos olhos". Eleita senadora em 2014, já presidiu a Comissão de Combate à Violência Contra a Mulher, criou o Observatório da Mulher contra a Violência, que faz relatórios sobre esse tipo de crime, e foi relatora de, pelo menos, 12 propostas que beneficiem a população feminina. Mas, quando se fala de aborto, ela fecha o assunto: é contra.

Mestre em Direito do Estado, professora universitária de Direito Administrativo por 12 anos, a senadora também foi deputada estadual, prefeita de Três Lagoas por duas vezes, vice-governadora e, agora, aos 48 anos, torna-se a primeira mulher a assumir a CCJ. Simone falou à Universa.

A senhora é contra a descriminalização do aborto. Dias atrás, o vice-presidente Hamilton Mourão, que é homem, militar e conservador, disse que o aborto "é uma opção da mulher". Nem essa mudança dos tempos faz com que a senhora reconsidere sua posição?
Não. Esse é um dos poucos temas em que tenho uma posição conservadora. Sou católica, estudei em colégio de freiras e entendo que a vida se dá a partir da concepção. O direito da mulher sobre o próprio corpo vai até onde começa o direito do outro. Sou favorável ao aborto legal (nos casos de estupro, de risco de vida para mãe e feto e de anencefalia).

No Brasil, uma mulher morre a cada dois dias por causa de abortos inseguros. Além disso, o Senado desarquivou a PEC 29/2015, que criminaliza o aborto em casos já autorizados pela lei. E a senhora aprovou o desarquivamento. Não vê a PEC como um risco para os direitos das mulheres?
Sobre os abortos ilegais, não é porque há omissão do Estado que vou permitir ou legalizar uma situação adversa. Sobre a PEC, o autor do requerimento para desarquivar a proposta, senador Eduardo Girão (PROS-CE), me apresentou uma emenda que vai ser colocada no projeto para evitar que haja essa interpretação. Quando o texto falar que é preciso garantir o direito à vida desde a concepção, haverá uma ressalva para os casos já amparados pela lei.

O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, anunciou, na quinta-feira (14), que o texto da reforma da Previdência proposto por Bolsonaro estabelecerá uma idade mínima de 65 anos para aposentadoria de homens e de 62 anos para mulheres. A senhora é a favor dessas idades? Vai trabalhar para que elas sejam aprovadas na CCJ?
Concordo com a ideia de que a mulher tem que se aposentar antes. Há um desgaste natural nosso, que temos dupla, tripla jornada de trabalho. Além disso, quando a mulher se aposenta, muitas vezes permanece com o custo familiar de cuidar da casa e dos filhos. Também recebemos salários menores nas mesmas condições de trabalho. Mas quero estudar a proposta do governo com cuidado para poder definir meu posicionamento.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) teve uma derrota humilhante na eleição para a presidência do Senado, e muito disso se deveu à senhora, que se candidatou mesmo sendo do mesmo partido, exigiu que o voto fosse aberto e era a favor de um novo nome para o cargo. Está se tornando a figura-mestra do partido?
O MDB precisa ser refundado, mas não quero ser a protagonista disso, porque esse movimento será feito em conjunto. A votação para presidência do Senado abriu uma fronteira ao enfrentar um colega de bancada. O partido precisa ser oxigenado e enxergar que envelheceu. O MDB se desviou do seu caminho de ser de centro porque quis o governo a todo custo. E isso antes mesmo de Michel Temer se tornar presidente.

Outra proposta polêmica que será votada brevemente na CCJ é a diminuição da maioridade penal para 16 anos -- proposta essa, inclusive, feita por um colega de partido da senhora. Qual é a sua opinião sobre o tema?
Não concordo. É simplista dizer que colocar jovens na cadeia vai resolver a criminalidade. É o governo se omitindo de dar perspectiva de futuro. Só que a sociedade está propensa a apoiar e acredito que a legislação tenha que ser debatida. Nesta e em outras discussões na comissão, meu selo será o da imparcialidade. Posso até não concordar, mas não tenho direito de negar uma proposta por isso.

O presidente do PSL, Luciano Bivar, declarou que mulher não tem vocação para política. Algum comentário?
É uma aberração. Na política, mulher tem que chegar empurrando a porta. Chego chegando, batendo na mesa. Mas sem perder a ternura. A pauta feminina é minha menina dos olhos, mas também falo de economia, saúde e direito, que é minha área.

Quantas horas a senhora trabalha por dia?
Entro no Senado às 8h e saio às 21h. Às sextas-feiras viajo para o Mato Grosso do Sul, falo com o governador, com prefeitos. No sábado, viajo para outras cidades do Estado. No domingo fico com a minha família. Sou casada, tenho duas filhas, uma de 18 e outra de 21, e costumamos ir ao cinema juntos. Adoro ver filmes, até os da Marvel, de super-herói. Fico feliz da vida com um saquinho de pipoca na mão. O último que vi e gostei foi "Bohemian Rhapsody". Sou apaixonada pelo Queen, Freddie Mercury foi um ícone da minha juventude.

O STF (Supremo Tribunal Federal) está discutindo a criminalização da homofobia. Qual a sua posição sobre o tema?
Sou a favor da homofobia se tornar crime. Acredito que tem que haver um qualificador específico para punir alguém que seja homofóbico. Só lamento que isso não esteja sendo debatido no Congresso. Poderíamos ter avançado, mas deixamos passar.

Como funciona a bancada feminina do Senado com tantas mulheres de perfis e ideologias diferentes?
Isso é uma coisa que me deixa feliz. Somos uma voz uníssona pelas causas das mulheres. Quando debatemos feminicídio, que virou crime em 2015, ou aumento de pena para estupro coletivo, estivemos sempre muito unidas, deixando de lado posições ideológicas e partidárias. Até no período do impeachment de Dilma Rousseff (que a senadora foi a favor), havia votos diferentes de outras senadoras, mas mesmo assim, nos reuníamos para debater propostas que tínhamos que levar para frente.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Ao contrário do informado na matéria, a PEC desarquivada pelo Senado foi a 29/2015, e não a 181. O erro já foi corrigido.