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Proposta do Senado pode proibir aborto até em caso de estupro; entenda

Marcos Candido

Da Universa

14/02/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Senadores contrários ao aborto desarquivaram uma proposta que pode proibir a interrupção da gravidez até em casos já permitidos
  • Iniciativa demonstra força de novos senadores contra oposição e mantém uma represália ao Supremo Tribunal Federal
  • A PEC será enviada para discussão e possível votação em uma comissão do Senado

Senadores contrários ao aborto reviveram nesta terça (12) uma proposta que pode impedir a interrupção da gravidez até mesmo em casos de estupro. É a PEC 29/2015, que se aprovada altera a Constituição e proíbe o procedimento em qualquer circunstância. Atualmente, o aborto pode ser feito legalmente em caso de risco de vida à mulher, estupro e anencefalia (má formação cerebral). Quer entender melhor? Universa explica.

O que é essa tal de PEC?

Uma PEC é uma Proposta de Emenda Constitucional. A Constituição é um conjunto de normas que regem nossos princípios, serve como guia para a criação de leis e dá organização ao estado brasileiro. Ela pode ser "emendada" -- ou seja, receber novos preceitos.

Por que querem proibir até o aborto em caso de estupro?

A PEC 29/2015 foi apresentada pelo ex-senador Magno Malta. Segundo ele, a Constituição precisa cuidar do feto desde a concepção.

Sem essa proteção, ele afirmou que há "grave atentado à dignidade da pessoa humana que se vê privada de proteção jurídica na fase de gestação, justamente a fase em que o ser humano está mais dependente de amparo em todos os aspectos".

Senadores da ala evangélica e bolsonarista reviveram a proposta para demonstrar força no Senado contra representantes do PT e de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

O que causou debate entre senadores e ministros do Supremo?

Acontece que o aborto foi permitido em caso de fetos anencéfalos pelo STF, em 2012. Em 2016, uma das turmas do tribunal também absolveu funcionários de uma clínica de aborto. Na época, Luis Roberto Barroso disse que a criminalização não protegia direitos sexuais e reprodutivos, autonomia, integridade psíquica e física e saúde da mulher. E, como confirmam os números, isso gera um impacto desproporcional sobre as mulheres mais pobres. "Além disso, criminalizar a mulher que deseja abortar gera custos sociais e para o sistema de saúde, que decorrem da necessidade de a mulher se submeter a procedimentos inseguros, com aumento da morbidade e da letalidade", decidiu.

A decisão gerou a represália da ala mais conservadora do Senado e da Câmara dos Deputados. Os parlamentares argumentam que a decisão sobre o tema aborto deve ser tomada pelo Poder Legislativo e não por um suposto "ativismo judicial". Para eles, os juízes estariam fazendo política, quando deviam apenas julgar as leis.

Em 2017, também foi apresentada no Congresso a PEC 181, proposta semelhante que causou protestos de órgãos em defesa da mulher.

E o que os senadores querem com essa PEC 29/2015?

Os senadores pretendem discutir uma PEC que quer garantir direito ao feto "desde a concepção". Desde a década de 1940, o aborto é legalizado em casos especiais por meio do Código Penal.

Acontece que esse código não pode contradizer uma coisa que está na Constituição. Se aprovada, a PEC, então, na leitura de juristas, "forçaria" uma retirada do aborto permitido por lei. A proposição altera o artigo 5º da Constituição para determinar a "inviolabilidade do direito à vida desde a concepção".

Segundo o professor em Direito Constitucional Clever Vasconcelos, a Constituição já faz a garantia da preservação da vida desde a concepção. "Nossa Constituição já garante a todos os brasileiros o direito à dignidade humana, o que já faz a proteção desde a concepção", analisa.

O que os senadores tentam agora é deixar esse preceito mais claro, sob protestos de senadores que afirmam não haver consenso sobre quando a vida começa, de fato.

Atualmente, a interrupção da gravidez só pode ser feita pelo Sistema Único de Saúde, nas 12 primeiras semanas de gravidez, quando a mulher é vítima de violência sexual, se há risco de vida da mãe ou o se bebê não tem cérebro.

E o que a PEC precisa para ser aprovada?

Os senadores que tiraram a  PEC do arquivo pretendem enviá-la à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. Lá, será discutida e votada. Caso aprovada, será discutida e votada no Plenário do Senado.

Nessa última etapa, o projeto é defendido e votado pelos senadores. Caso receba a maioria dos votos, a PEC é aprovada e enviada a uma nova votação na Câmara dos Deputados.

Para modificar a Constituição, a proposta de emenda precisa ser aprovada em dois turnos no Senado e na Câmara com os votos de ao menos 49 senadores e 308 deputados, respectivamente.