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Homens de maiô: por que eles estão usando essa tradicional peça feminina?

O produtor cultural Caio Revela, 30, usa o maiô em looks do dia a dia e na piscina - Arquivo Pessoal
O produtor cultural Caio Revela, 30, usa o maiô em looks do dia a dia e na piscina Imagem: Arquivo Pessoal

Natália Eiras

Da Universa

16/01/2019 04h00

"Provavelmente eu tenho mais maiôs do que você". Esta é a frase que aparece na mini-biografia do produtor cultural Thum Thompson, 34, de Brasília (DF), em seu perfil no Tinder, aplicativo que usa para conhecer mulheres. O rapaz tem, em seu armário, 17 peças da roupa de banho e não fica acanhado em desfilar em festas e em fotos no Instagram com maiôs em cores vibrantes. "É uma provocação. Por que eu vestir um maiô causa tanto estranhamento?", pergunta o produtor. "É só uma roupa, todo mundo usa". 

Thum e o produtor de moda Caio Revela, 30, do Rio de Janeiro (RJ) são alguns dos rapazes que, independentemente da orientação sexual, têm usado, neste verão, maiôs e bodies, itens mais comuns no vestuário feminino. Os motivos vão desde um posicionamento político até uma escolha fashion: de acordo com eles, a peça representa um protesto silencioso contra o estereótipo de gênero e padrões de beleza, mas também é confortável, perfeito para os dias mais quentes. 

"Eu uso isso porque eu gosto, me sinto maravilhoso", fala Caio, em entrevista por telefone. Parte da militância plus size e apaixonado por moda, o produtor de moda diz que se torna uma outra pessoa quando usa uma de suas dez peças, que têm estampas como unicórnio, pelicanos e arco-íris. "É uma experiência. Eu, que sempre tive que usar roupas sem graça, sinto que mudo completamente quando coloco um maiô". 

Thum Thompson, 34, tem uma coleção de 17 maiôs em casa - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Thum Tompson, 34, tem uma coleção de 17 maiôs em casa
Imagem: Arquivo Pessoal

Caio experimentou a peça pela primeira vez no ano passado, na gravação de um clipe da festa que ajuda a organizar, a Toda Grandona. "Comecei pegando emprestado os maiôs das minhas amigas gordas, porque não sabia se iria querer continuar usando", afirma. Desde junho de 2018, ele tem vestido a peça em looks para sair durante o dia, combinada com bermuda jeans, e para festas na piscina, quando capricha no protetor solar para não ficar com marca.

Mesmo ficando incomodado com o olhar das pessoas, ele diz que coloca o próprio conforto em primeiro lugar. "O meu objetivo não é chocar os outros, mas existir como uma pessoa gorda, usando a roupa que eu quero usar. Moda, acima de qualquer coisa, é você se sentir confortável. Se eu coloquei uma peça e eu me sinto à vontade com ela, por que não usar?", explica. 

No caso de Thum, o maiô ganhou um espaço em seu guarda-roupa em 2012, quando fez uma fantasia de nado sincronizado com a namorada da época. A partir dali, ele curtiu o visual e começou a adotá-lo em festas da noite de São Paulo (SP). "Sempre brinquei com o meu corpo de uma forma política sem saber. Pintava o cabelo, usava vestido de chita em festa junina. Foi natural começar a usar o maiô", conta. Logo, a peça virou sua marca registrada. Atualmente, se ele chega em um evento sem a roupa de banho, as pessoas já estranham. "Até brinco que alguns lugares não merecem que eu vista um maiô", ri. 

Para garantir o conforto, Caio Revela manda fazer seus maiôs sob medida. "É importante que ele seja do seu tamanho, para não machucar na virilha nem nos ombros", diz o estilista. A parte de baixo também não pode ser muito cavada, para não machucar a genitália dos meninos. "Não recomendo os bodies e maiôs com fecho no fundilho", aconselha Caio. Tanto Revela como Thum não prendem (para esconder) as partes íntimas, então eles optam por peças com fundo mais largo. "Também uso pochetes, blusas e lenços para dar uma 'disfarçada' na mala", complementa Tompson. 

"Ele é hétero?"

A escolha do look faz, de acordo com Thum, com que muita gente não acredite que ele seja heterossexual. "Eu mesmo não acreditei quando ouvi", brinca Caio. Para Tompson, vestir um maiô não o faz duvidar em nenhum momento de sua orientação sexual. "Inclusive quebra o gelo. Em festas, a menina vem falar comigo por causa dele e começamos a conversar", diz Thum. "Algumas até brincam que nunca pensaram que beijariam um 'boy' de maiô no rolê". 

Apesar de apostar na roupa de banho há sete anos, o produtor cultural Thum começou a refletir mais sobre o porquê de suas roupas chamarem tanta atenção há pouco tempo. "Algumas pessoas realmente se sentem incomodadas e agredidas por me verem de maiô", fala Thum. "Antes eu questionava essa heteronormatividade de uma forma mais sútil, mas estou pensando em fazer isso mais ativamente no Instagram". 

Ainda assim, tanto Thompson como Caio acreditam que o fato de curtirem usar maiô não deveria ganhar tanta atenção. "Eu não descobri a cura do câncer, não estou fazendo nada de excepcional. É só um maiô", ri Revela.