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Escola de cinema do Rio afasta professor acusado de assediar 13 alunas

Rodrigo Fonseca - Reprodução/Instagram/rodrigo_fonseca79
Rodrigo Fonseca Imagem: Reprodução/Instagram/rodrigo_fonseca79

Da Universa

29/07/2018 15h05

A Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro, anunciou o afastamento do professor Rodrigo Fonseca após 13 alunas da instituição terem denunciado o docente por assédio moral e sexual na última quinta-feira (26). 

De acordo com as denúncias publicadas preliminarmente pelo "Buzzfeed News", Rodrigo abordava as alunas fora da sala de aula, as convidava para sair prometendo ajudá-las com o conteúdo da matéria e, se o convite fosse aceito, fazia investidas sexuais. 

Veja também: 

Em carta aberta, os estudantes falam sobre ligações durante a madrugada, "bajulações sem fundamento profissional que poucos ou nenhum [aluno] homem recebiam" e maus tratos a alunas que recusaram suas investidas. 

Uma aluna disse que o professor chegou a tentar beijá-la à força, segurando-a pela nuca: "Nas semanas seguintes, ele começou a me destratar em sala. Tudo o que eu respondia ou escrevia estava errado”.

Rodrigo dava aulas na instituição desde março deste ano. 

"A Escola apoiou e atuou, como, inclusive, continua apoiando as alunas, fazendo com que toda a turma não tivesse mais qualquer contato com o Professor, cujo contrato não foi renovado, estando afastado da Escola.", escreveu a Darcy Ribeiro, ao anunciar a decisão. 

A escola afirmou ainda que, além de afastar o profissional, está prestando apoio psicológico e jurídico às alunas que fizeram a denúncia. 

No mesmo dia, o site de cinema e cultura pop "Omelete", que contava com Rodrigo entre seus colaboradores, também decidiu desligá-lo "em respeito às estudantes da Escola de Cinema Darcy Ribeiro". 

Ao "O Globo", Rodrigo afirmou que pediu afastamento da presidência da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ), cargo que ocupava desde o início do ano. A ACCRJ, no entanto, ainda não se menifestou sobre o assunto.

De acordo com o "Buzzfeed News", Rodrigo negou que tenha cometido os assédios denunciados e afirmou que ele mesmo pediu afastamento das salas de aula por problemas de saúde. 

Procurado por Universa, o escritório carioca de advocacia Arthus Lavigne não se manifestou até a publicação da matéria, na tarde deste domingo (29). 

Repercussão

O crítico cinematográfico (e amigo pessoal do acusado) Pablo Villaça se manifestou sobre o caso nas redes sociais, dizendo que apesar de ser próximo de Rodrigo, não pode ignorar a denúncia das vítimas: 

A ativista Carol Bittencourt também escreveu sobre, reforçando as denúncias: 

Nas redes sociais, não faltaram críticas ao ex-professor e pedidos para que outros veículos que ainda contam com o roteirista entre seus colaboradores, como o "Jornal do Brasil", também anunciem seu afastamento. Veja:

Leia a carta aberta dos estudantes da Escola de Cinema na íntegra: 

"CARTA ABERTA DOS ALUNOS DA DARCY RIBEIRO

Em reunião realizada no dia 09 de julho de 2018, 13 alunas da Escola de Cinema Darcy Ribeiro relataram às turmas de Roteiro, Direção, Montagem e Produção I assédio sofrido pelo professor Rodrigo Fonseca ao longo das aulas do primeiro semestre do ano corrente.

Rodrigo Fonseca tornou-se professor da turma em março do ano de 2018, aparentemente cordial e prestativo. Docente notável, sempre tentando aproximar-se e agradar os alunos, levava comida e livros para distribuir durante as aulas, sempre sorridente e simpático. Mas sua simpatia tinha interesse restrito e direcionado. Desde as primeiras aulas dava orientações profissionais às suas alunas; os biscoitos e ofertas de livros logo viraram ingressos para filmes e debates, entradas gratuitas em eventos e cursos, bajulações sem fundamento profissional que poucos ou nenhum homem recebiam.

A partir disso, as alunas, crendo em sua boa fé, começaram a ver-se em situações constragedoras. Ligações durante a madrugada, mensagens abusivas, olhares asquesoros, tentativa de contato físico, perseguição dentro de eventos. A bondade e atenção viraram constatação: a contribuição dele não era profissional, mas sim, dotada de interesse sexual, que como nunca foi correspondido, resultou em inúmeras ofensivas por parte do professor.

O docente não respondia mais às perguntas das alunas assediadas, e quando o fazia, era sem seriedade, demonstrando fúria e imaturidade, colocando-as em posição de extrema opressão. Durante as aulas, fazia piadas vexatórias com as alunas abordadas, com intenção de humilhação.

Com o tempo as aulas se esvaziaram, muitas mulheres ausentes; mulheres disciplinadas, assíduas, já não frequentavam as aulas. Um estranhamento começou a ocorrer, e com ele, uma identificação. As alunas começaram a se falar, e enfim, estavam num grupo de 13 mulheres relatando as mesmas vivências e opressão, do mesmo assediador.

Durante a reunião, foram relatados inúmeros assédios, desde simples cantadas, presentes dados às alunas pelo professor, ligações inexcrupulosas, ameaçadoras e em horários inapropriados, a uma tentativa de beijo na boca de uma aluna sem consentimento e perseguição a outra durante um evento. Cabe ressaltar que todas as alunas que informaram ser comprometidas deixaram de contar com a mesma atenção.

Além dos relatos de assédio sexual, foram presenciados durante as aulas assédio moral, com ameaças de perda de pontos para quem questionasse o professor em qualquer conceito que não o agradasse. O mais grave ocorreu no dia 04 de julho, quando o professor disse, grosseiramente e de modo alterado, a um aluno que não responderia nenhuma pergunta enquanto ele “não sentasse o rabinho na cadeira”. Durante a reunião, outras pessoas denunciaram falas racistas, xenófobicas, homofobicas, preconceituosas e intolerantes. Todas travestidas de piada e licença poética.

Cabe ressaltar que o assédio pode vir de uma atitude verbal ou física, com ou sem testemunhas, e acontecer em sala de aula, ônibus, ambiente de trabalho, boates, consultórios médicos, na rua, em templos religiosos. O assédio não tem um local específico. No caso, há clara relação de poder de um professor, reconhecido no mercado, investindo contra alunas que sentem-se intimidadas com as consequências de suas denúncias.

Quando um homem tem interesse em conhecer uma mulher, ou elogiá-la, ele não lhe dirige palavras que a exponham ou a façam sentir-se invadida, ameaçada ou encabulada. Caracteriza-se como assédio verbal (artigo 61, da Lei das Contravenções Penais n. 3.688/1941), quando alguém diz coisas desagradáveis ou invasivas - como podem ser consideradas as famosas “cantadas” - ou faz ameaças.

Diante dos inúmeros relatos, reiterados de forma contundente e emocionada, a turma comunicou à coordenação da Escola de Cinema Darcy Ribeiro em uma reunião com a presença de cerca de 80 alunos, naquele mesmo dia, cobrando providências. Com a gravidade dos fatos e dos inúmeros relatos das alunas, a coordenação se comprometeu em frente aos presentes a desligar o professor, ratificando que esse tipo de comportamento não pode ser aceito pela instituição.

Destarte, reiteramos tudo que foi exposto na reunião e com o pronunciamento oficial da escola, para resguardar a integridade e a honra das alunas denunciantes, que foram vítimas de assédio.

Esta carta não é somente uma denúncia pública e coletiva, mas também uma resposta ao senhor Rodrigo Fonseca. As vítimas são muitas e estão unidas, fortes e tranquilas de sua postura, contando com o apoio da instituição, de todos os discentes e da opinião pública.

Não nos intimidaremos. Não nos silenciará. Somos muitos! Ao contrário do que você e muitos imaginam ao assediar, nós nos falamos e nos cuidamos e denunciamos, sim, cada assédio sofrido. A cada assédio denunciado, outros tantos aparecem. Não por histeria coletiva, não estamos fantasiandos, e não queríamos estar aqui hoje, perdendo saúde, tempo e vida para berrar os assédios sofridos; queríamos não ter sido, mas fomos, por você.

Os inocentes não ficarão calados, por mais difícil que seja falar.

ASSINADO: TODOS os alunos do Módulo I"