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"Meu filho se tornou neonazista e matou um homossexual com uma facada"

"Quando pequeno, meu filho era como qualquer outro garoto, nunca notamos nada de diferente nele" - Getty Images
"Quando pequeno, meu filho era como qualquer outro garoto, nunca notamos nada de diferente nele" Imagem: Getty Images

Carolina Prado

Colaboração para a Universa

24/06/2018 04h00

Aos 23 anos, o filho do aposentado Roberto*, de 65, se envolveu no assassinato de um homossexual. Desde a adolescência, o pai notava no jovem um comportamento rebelde, mas diz que as coisas pioraram quando ele se uniu a grupos de ódio, de postura neonazista. "Eu tentava entender porque ele estava se envolvendo com tudo aquilo. Fiz o que pude para tirá-lo desse caminho", afirma. A seguir, ele conta como as atitudes do filho foram se tornando preocupantes e o que teria feito de diferente, hoje, para impedir que o filho chegasse a cometer um crime brutal. "Uma das coisas mais importantes é ensinar a criança, desde pequena, a entender e a respeitar todos os tipos de pessoas e as opiniões dessas pessoas", diz.

"Quando pequeno, meu filho era como qualquer outro garoto, nunca notamos nada de diferente nele. Mas bastou chegar a adolescência e começamos a ter problemas. Ele passou a ler sobre pessoas, artistas rebeldes, e notei nitidamente que ele mudou a personalidade. Passou a se comportar mal na escola, inclusive com reprovações, apesar de ser bastante inteligente.

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Nessa época, eu só sabia que ele andava com colegas que participavam de manifestações e que ia a shows de rock. Foi só depois de muito tempo, quando ele tinha 20 anos ou mais, que descobri que ele fazia parte de grupos como Vingança Punk, Impacto Hooligan.

Em casa, ele chegava a comentar que passava por situações de perigo, que fugia para não apanhar e eu e a mãe explicávamos que o que ele estava fazendo era arriscado, e que alguns de seus atos eram ilegais e incitavam a mais violência. Ele não contava tudo o que acontecia, logicamente.

Era comum ele faltar ao respeito comigo, com a mãe e com os irmãos. Ele se orgulhava de sua rebeldia, era muito convencido de que estava certo e tinha bastante argumento para justificar suas ações.

Quando ele ainda era adolescente, por volta dos 15 anos, nós o levamos para tratamento psicológico, que ele frequentou por aproximadamente dois anos. Também tentamos outras maneiras de ajudá-lo: fizemos com que ele nos acompanhasse a alguns cultos evangélicos e investimos na carreira musical dele, inclusive com a gravação de um CD amador.

Nas artes marciais, nós o apoiamos bastante, para que participasse de competições. Além de tudo isso, eu dei a ele o exemplo de trabalhador honesto, me aposentei com quase 40 anos de serviço e eu e a mãe dele somos casados há 36 anos. Ainda assim, acho que posso ter falhado em alguma coisa, talvez minhas tentativas não tenham sido as mais corretas.

O crime

Quando ele cometeu o crime, tinha 23 anos, estava acompanhado de dois colegas. Eles avistaram quatro homens que tinham 'aparência' de homossexuais.

Ele se orgulhava de sua rebeldia, era muito convencido de que estava certo

Ficaram encarando e um deles veio até o meu filho, falar para que eles não ficassem olhando, defendendo os amigos. Aí meu filho estava com uma faca e avisou que ia usar se ele continuasse se aproximando. Meu filho deu uma facada na região abdominal do rapaz e depois correu, com medo da polícia.

O socorro demorou para chegar e a vítima morreu durante a madrugada. Meu filho ficou sabendo depois e a minha família ficou perplexa com a notícia. No julgamento, passamos a noite toda em claro. Ele foi condenado e cumpre pena em regime fechado, mas não sabemos por quanto tempo, porque há uma revisão criminal em andamento.

Se fosse hoje, eu teria tentado conhecer melhor as companhias do meu filho e, ao descobrir que ele estava em um caminho errado, teria pedido ajuda a outras famílias que já tivessem passado pelo mesmo problema ou mesmo às autoridades ou, no caso de ser um menor de 18 anos, ao Conselho Tutelar.

Também acho importante ensinar ao filho, desde pequeno, a entender e a respeitar todos os tipos de pessoas e as opiniões dessas pessoas. Talvez assim seja possível evitar outras tragédias."

* O nome foi trocado a pedido do entrevistado.

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