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Elas engravidaram ao tomar antibiótico e anticoncepcional: entenda o motivo

Alguns remédios cortam o efeito da pílula - Getty Images
Alguns remédios cortam o efeito da pílula Imagem: Getty Images

Amanda Serra

Da Universa

21/06/2018 04h00

Histórias de mulheres que combinaram anticoncepcionais – tanto pílula quanto injeção – com antibióticos e engravidaram não são raras. Durante a apuração desta reportagem, que durou seis dias, pelo menos seis novos casos surgiram. Desinformação e falta de orientação médica, de farmacêuticos e outros profissionais da saúde são os principais motivos. 

Daniele e as filhas - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Daniele e as filhas
Imagem: Arquivo Pessoal

“Tomava anticoncepcional injetável há 12 anos, aí durante um tratamento de canal após usar amoxicilina por 10 dias, engravidei. Nunca tinha ouvido falar que antibiótico cortava o efeito (assim como o parceiro). Tinha acabado de me separar”, conta a recepcionista Daniele Bisachi Dias, 31.

Mas por que isso ocorre?

Quais são esses remédios? E o que fazer? As respostas dos especialistas.

“Tanto os antibióticos quanto a pílula são metabolizados no fígado no mesmo local e isso faz com que exista uma competição entre eles. Por conta disso, o organismo não consegue absorver a quantidade necessária de hormônio dos anticoncepcionais, responsáveis por impedirem a ovulação”, diz o ginecologista e obstetra Wagner Rodrigues Hernandez, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).

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Alberto d’Auria, obstetra da maternidade Pro Matre Paulista, explica que isso ocorre pela baixa dosagem de hormônio nos contraceptivos femininos. “Na década de 60, quando eles foram criados continham uma grande quantidade de hormônios, mas isso fez com que muitas mulheres relatassem fortes dores de cabeça. Diminuíram a dose e a combinação com antibióticos, por exemplo, faz com que sua eficácia seja reduzida.”

Amoxicilina, Eritromicina, Penicilina, Doxiciclina, Vibramicina e alguns antifúngicos como Fluconazol são alguns dos responsáveis por alterar a absorção dos hormônios contidos nos anticoncepcionais. “Esses antibióticos podem reduzir a quantidade de hormônio no sangue, pois modificam a metabolização e isso diminui a eficácia contraceptiva”, completa Alberto.

Anticonvulsivantes como Fenobarbital, Fenitoína, Carbamazepina e Topiramato, além da Rifampicina, antibiótico usado em casos de tuberculose, também se combinados com as pílulas podem provocar uma gravidez indesejada. “Se o uso desses medicamentos costuma ser comum, o ideal é que o anticoncepcional seja substituído por outros métodos contraceptivos ou haja a combinação com o preservativo”, alerta Wagner. Remédios para tireoide e corticoides também merecem uma atenção especial, já que modificam a absorção do anticoncepcional no corpo. 

Outro detalhe que as mulheres precisam estar ligadas é com casos de vômitos e diarreias, principalmente, durante o uso de antibióticos. Eles costumam desmantelar a flora intestinal. “Fique atenta com os efeitos colaterais dos antibióticos em casos de infecções intestinais. Se a mulher tiver tomado a pílula e passado mal em seguida, isso fará com que o remédio perca o efeito”, diz Hernandez.

Chás também? Sim. “Sabemos também que a erva de São João, também conhecida como Hipérico, reduz o efeito", avisa o médico.

Outras falhas citadas pelos médicos são o esquecimento da pílula (que precisa ser responsabilidade tanto do homem quanto da mulher) e não ler a bula.

Não tem uma semana em que não aparece uma grávida que tomou antibiótico junto com anticoncepcional. Esses casos são comuns no consultório. E o problema está em começar a tomar anticoncepcional sem orientação médica É preciso entender o que está tomando, as modificações que ocorrem no organismo, os riscos. Não é só enviar 'o nome de um anticoncepcional bacana' como me pedem algumas pacientes. É preciso definir horários, os ciclos. A prescrição de medicação demanda tempo e é necessária. Não é algo simples”, diz Alberto, que garante alertar suas pacientes sobre as ciladas que ocorrem no universo feminino.

Portanto, a recomendação é: está tomando antibiótico, faz uso frequente dos medicamentos citados ou qualquer outro remédio para infeção? Leia a bula médica, pergunte ao médico e use camisinha também. “O ideal é usar o preservativo no mesmo dia que começou a tomar antibiótico e seguir assim por mais dois, três dias após o fim do tratamento”, afirma d’Auria.

Um canal e crise de sinusite resultaram em bebês!

Gabriela e o filho Heitor - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Gabriela e o filho Heitor
Imagem: Arquivo Pessoal

“Comecei o tratamento no dentista e ele não perguntou se eu tomava anticoncepcional, ou me alertou que o antibiótico cortaria o efeito da injeção. Só soube depois de grávida quando a ginecologista falou. Na hora foi um susto, pensei em abortar, mas não teria coragem... Depois fiquei feliz. Mesmo separada, meu ex acompanhou o parto. Ele e minha filha têm total convivência", diz Daniele, que agora lê todas as bulas.

Aos 29 anos, com uma segunda gravidez não planejada, a recepcionista precisou adiar a faculdade. "Assim como coisas do dia a dia que deixamos de lado quando temos um bebê”, diz ela, que foi mãe pela primeira vez aos 17 anos também sem planejar e assume o vacilo dela e do companheiro. “Foi descuido meu."

Gabriela Massi, 26, tomou o mesmo anticoncepcional durante oito anos sem problemas. Mas durante uma forte crise de sinusite (rotineiras em sua vida), sem saber dos possíveis efeitos, combinou a pílula com Azitromicina, antibiótico indicado para infecções de ouvido, bronquite, sinusite, úlceras e doenças sexualmente transmissíveis, além de uma injeção do corticoide Decadron.

“Continuei tomando o anticoncepcional normalmente até que minha menstruação atrasou. Fiz três testes de farmácia e deram negativo. Mas aí se passaram 20 dias e nada. Fiz o exame de sangue, negativo também. Marquei consulta na ginecologista para ver se estava com algum problema ginecológico ou hormonal e fui fazer exames”, conta a jovem, que descobriu a gravidez durante o transvaginal. “Na hora, soube que estava grávida de quase quatro meses e de um menino. Foi tudo junto”, lembra.

Há 11 anos em um relacionamento, a notícia foi recebida com entusiasmo pelo companheiro de Gabriela, mas com muitos medos por ela. “Queria engravidar, mas não com 26 anos, fazia planos para mais tarde. Tinha começado há só um mês num novo trabalho”, conta ela, que atualmente está com um bebê de cinco meses em casa.

Pega de surpresa, a jovem faz uma reclamação. “Se na triagem do posto de saúde a gente informa que toma anticoncepcional, por que o médico não verifica e avisa que antibióticos cortam o efeito? Já que perguntam se os pacientes tomam algum medicamento deveriam explicar.”