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Em nome da liberdade de escolha, mulheres decidem não depilar o corpo

Yannik D´Elboux

Do UOL, no Rio de Janeiro

13/05/2014 07h11

Pelo padrão de beleza atual, o corpo feminino não deve ter pelos para ser admirado. A ordem é depilar tudo em nome da higiene e da estética. Na contramão da moda, existem mulheres que estão deixando seus pelos crescerem naturalmente, nas axilas, pernas, na região íntima e até no rosto.

Mais do que lançar uma cruzada contra a depilação, essas mulheres dizem que querem ter liberdade de escolha. “Não há problema em tirar os pelos, o problema é a falta de opção sobre eles”, diz Nubia Abe, uma das criadoras do projeto "Pelos Pelos", integrante do coletivo de arte político-poética Além.

O "Pelos Pelos" traz fotos de mulheres nuas, que decidiram parar de se depilar. A proposta é enfatizar a naturalidade dos pelos e mostrar que essa opção existe. "Muitas mulheres nos escreveram afirmando que se sentiam solitárias por não se depilarem ou simplesmente por pensarem nessa possibilidade”, conta Nubia.

Recentemente, algumas celebridades também esquentaram o debate sobre esse assunto na mídia. A cantora Madonna apareceu com a axila peluda em uma imagem nas redes sociais, acompanhada da frase “Cabelo longo...Eu não me importo! Arte pela liberdade”. A ex-BBB Bella Maia também fez um ensaio em que seus pelos estavam à mostra.

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Diante dessa quebra de padrão, a reação mais comum, entre homens e mulheres, é de nojo. Quando resolveu lançar o editorial de moda "Winter" (inverno, em inglês), enfatizando os pelos do corpo de uma modelo, a fotógrafa francesa Alexandra Sophie recebeu várias críticas. “As pessoas deveriam saber que as mulheres também podem ser peludas e que isso não é absolutamente anti-higiênico ou feio”, diz.

Alexandra revela que percebeu uma grande diferença nos comentários conforme a região do mundo onde seu trabalho foi divulgado. “A maioria das reações de repugnância vieram de países da América do Sul e da Ásia, enquanto que as de encorajamento vieram da América do Norte, Europa e da Austrália”, afirma.

Higiene e depilação

Para quem defende a eliminação dos pelos, a higiene costuma ser a principal justificativa. Para a dermatologia Helena Costa, pós-graduada em medicina estética e membro da Sociedade Brasileira de Laser em Medicina e Cirurgia, essa questão depende dos cuidados de cada um. “Os pelos propiciam um aumento de umidade na região e, consequentemente, o mau cheiro”, explica.

A dermatologista acredita que as funções originais dos pelos, como proteção e controle de temperatura, já não são mais importantes nos dias de hoje, em que as roupas cumprem esse papel. Depilar-se ou não, para a médica, é uma decisão puramente estética. “Não sou nem um pouco contra tirar [os pelos]”, diz.

Apesar de não se opor à depilação, Helena Costa orienta suas pacientes a não erradicar definitivamente os pelos pubianos, também por uma razão estética. “Quando a gente vai envelhecendo, a região vai ficando escurecida, tendo uma certa flacidez e os pelos, de alguma maneira, disfarçam um pouquinho”, justifica.

A depilação total da região íntima, segundo a médica, é um desejo frequente entre as mais jovens, geralmente motivado pelo pedido dos namorados. “As mulheres acima de 30 anos não costumam ter essa vontade”, afirma a dermatologista.

Para Nubia Abe, que não se depila desde setembro de 2013, quando iniciou o projeto “Pelos Pelos”, o machismo e a sociedade de consumo são os principais responsáveis pela imposição de ter o corpo sempre liso. “Não é a mulher que escolhe se depilar ou não, a escolha está sempre associada à aprovação dos homens”, critica.

Helena Costa pensa de forma diferente. “É mais uma questão das próprias mulheres. As pacientes mais novas dizem que o namorado pede, mas é uma vontade delas também”, afirma.

Pelos já foram sexy

Se atualmente os pelos causam repulsa, há algumas décadas não era assim. A historiadora Mary Del Priore, autora do livro “Histórias e Conversas de Mulher” (Editora Planeta), conta que os fios das axilas femininas eram vistos com excitação. “Os pelos das axilas permitiam identificar a cor dos pelos púbicos e isso fazia com que os homens tivessem devaneios eróticos”, explica.

Até os anos 1920, as mangas compridas predominavam no vestuário feminino. As mangas curtas só surgem a partir daquela década, principalmente por causa da entrada da mulher no mercado de trabalho e das exigências de movimento, agilidade e leveza. Como os pelos das axilas eram extremamente eróticos para os homens, as mulheres precisavam raspá-los. “Era um atrativo monstruoso para o homem, seria como ver uma aréola de um mamilo nos dias de hoje”, compara Mary.

A moda continuou influenciando os padrões de beleza e conforme as saias foram diminuindo de comprimento, a depilação das pernas também se popularizou, assim como a das virilhas em razão dos biquínis. A indústria cosmética também contribuiu para esse hábito, que Mary Del Priore chama de movimento de higienização. “O corpo hoje não pode cheirar nada, a não ser perfume. É uma nova visão sobre o corpo”, diz.

Para a historiadora, a depilação excessiva é um modismo da nossa época e a resistência de algumas mulheres em relação a esse comportamento representa um retorno à naturalidade do corpo feminino. Mary lembra que as feministas dos anos 1960 também não raspavam seus pelos. “É uma resistência relacionada a essa percepção de valorizar a mulher como ela é, em carne e osso, do jeito que veio ao mundo”, finaliza.

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