Topo

Top model entra na polêmica sobre educação sexual na Polônia

Anja Rubik - Reprodução/Instagram
Anja Rubik Imagem: Reprodução/Instagram

Marek Strzelecki e Dorota Bartyzel

08/02/2019 15h06

A modelo Anja Rubik poderia ser o rosto de qualquer país moderno e progressista da Europa. Após aderir a uma campanha pelos direitos das mulheres, ela passou a defender a educação sexual e publicou um livro para adolescentes que contrabalança os ensinamentos da Igreja Católica.

Em sua terra natal, a Polônia, isso significa remar contra a maré política. O trabalho de Rubik tem menos a ver com o movimento que aprovou o casamento homoafetivo na Espanha e o aborto na Irlanda e mais a ver com o ressurgimento das forças do conservadorismo cristão alimentadas pelo governo nacionalista.

Na Polônia, Jesus Cristo foi nomeado rei oficial e refugiados muçulmanos foram acusados de espalhar doenças e barrados. A oposição afirma que o país está voltando aos tempos medievais. A narrativa por lá é que homossexualidade tem cura e preservativos são ruins. Ainda nesta semana, a organização Human Rights Watch criticou o governo polonês pelo tratamento dos grupos que lutam pelos direitos das mulheres.

Segundo Rubik, as aulas de educação sexual baseadas em ensinamentos religiosos só faltam falar de "dragões e bruxas". "As crianças ouvem que a menstruação é um grito sangrento do útero sem feto", disse ela em entrevista na qual explicou os planos de levar seu programa de educação sexual a todo o país no terceiro trimestre.

"Não estamos progredindo, estamos andando para trás, de certo modo estamos voltando para o século 19", disse Rubik, 35 anos, que estreou como modelo há duas décadas e desfilou para marcas como Yves Saint Laurent e Dolce & Gabbana. Isso vai "contra direitos fundamentais e constitucionais à informação e à educação", disse ela.

Desde que chegou ao poder em 2015, o Partido Lei e Justiça inverteu a trajetória da Polônia na direção do liberalismo da Europa Ocidental.

O partido fez do país um estado protetor e nativista que entra em conflito com a União Europeia em todo tipo de assunto -- da independência dos tribunais ao que se pode falar sobre o Holocausto. O governo está em uma cruzada contra o aborto e contra um tratamento de fertilidade ao qual a Igreja se opõe. As autoridades também incentivam as mulheres a se manterem fora do mercado de trabalho com subsídios à família que não existiam antes.

O Partido Lei e Justiça se coloca como salvador dos tradicionais valores cristãos na Polônia e Europa, alegando que o continente perdeu sua bússola moral quando adotou ideologias feministas e seculares.

O chefe do partido, Jaroslaw Kaczynski, convocou os poloneses a liderar uma "Europa doente" no caminho da "saúde, dos valores fundamentais, da liberdade verdadeira e do fortalecimento da nossa civilização com base no Cristianismo".

Quem se opõe, afirma que as coisas foram longe demais. No ensino médio, aulas de "Educação para a Vida em Família" costumam promover a divisão tradicional de funções entre homens e mulheres, são abertamente homofóbicas e não apresentam métodos contraceptivos, disse Liliana Religa, da Federação para Mulheres e Planejamento Familiar.

Essas aulas têm "mais ideologia do que nunca" e as escolas são pressionadas pelo Ministério da Educação a manter distância das organizações não-governamentais, de acordo com Religa. "Os poloneses cansaram de leis e decisões que nos levam de volta à época medieval", disse ela.

Dois anos atrás, 100.000 mulheres saíram às ruas para defender o direito ao aborto e forçaram o governo a diminuir esforços para expandir as restrições à interrupção da gravidez, que já estão entre as mais rigorosas da Europa.

Rubik quis ir além. Ela produziu 14 vídeos curtos sobre sexo que foram vistos por 10 milhões de pessoas na internet. Depois escreveu o livro #sexedpl, que já vendeu 130.000 exemplares. Mas quando ela enviou 1.000 cópias a escolas, veio a reação.

Alguns diretores de escola proibiram o livro, segundo Rubik. O instituto estatal de literatura considerou a modelo uma promotora inadequada da Polônia. Também foi tachado dessa maneira o ex-primeiro-ministro Donald Tusk, que hoje preside o Conselho Europeu.

No final do ano passado, o governo liderado pelo Partido Lei e Justiça apresentou um projeto de lei que excluía um único episódio de agressão da definição de violência doméstica. A proposta foi retirada em poucas horas, diante da revolta dos grupos de defesa de direitos humanos. Ainda assim, o governo cortou verbas para grupos que ajudam mulheres vítimas de agressores, alegando que tinham viés esquerdista.

Rubik pretende expandir sua campanha e quer que as pessoas falem mais abertamente sobre como educar a juventude polonesa sobre questões sexuais.

"Sonho com um ônibus Sexedpl que levará educadores e fará oficinas por toda a Polônia", disse Rubik, que procura empresas patrocinadoras. "Mesmo que educação sexual seja um tema arriscado na Polônia."