Topo

#MeToo atinge histórico centro jurídico de Londres com denúncia

Mulheres usam a hashtag #MeToo em protesto em Paris contra abuso sexual  - Bertrand Guay/AFP
Mulheres usam a hashtag #MeToo em protesto em Paris contra abuso sexual Imagem: Bertrand Guay/AFP

Kaye Wiggins

Da Bloomberg

30/11/2018 15h26

O movimento #MeToo, em que mulheres denunciaram casos de assédio sexual em todo o mundo, chegou ao centro do histórico distrito jurídico de Londres, onde uma importante advogada revelou suas experiências na quinta-feira (29) e afirmou que outras colegas sofreram o mesmo.

Jo Delahunty, uma advogada sênior especialista em processos com crianças e famílias, revelou à plateia no Barnard's Inn Hall – cenário que ficou famoso com o romance Grandes Esperanças, de Charles Dickens – que o desequilíbrio de poder na profissão havia possibilitado que algumas mulheres fossem maltratadas.

Veja também

As experiências vividas quando era advogada júnior foram desde assobios no ambiente de trabalho até uma vez em que chegou a um hotel com um colega de trabalho em uma viagem de negócios e descobriu que o homem – 30 anos mais velho que ela – havia reservado um quarto duplo para ambos.

"Enfrentei uma situação naquele momento na qual tinha que decidir o que fazer", consciente de que dizer não poderia ser prejudicial à carreira, disse ela. "Mas eu disse não."

À tona

Outras advogadas contaram histórias semelhantes a ela, e alguns homens disseram que também foram assediados por outros homens no trabalho, disse. As experiências deles ocorreram neste ano, o que sugere que o problema não desapareceu desde sua época de iniciante.

Ela disse que o discurso realizado na noite de quinta-feira foi a primeira palestra pública sobre o assunto da qual ouviu falar.

"Isso precisa vir à tona. É inaceitável", disse Delahunty durante o discurso. "Não podemos mais afirmar que não enfrentamos esse tipo de problema no ambiente do Direito."

Desde que as acusações de agressão contra o magnata de Hollywood Harvey Weinstein provocaram uma indignação global, no ano passado, muitos indivíduos de destaque foram acusados de má conduta em diferentes setores em todo o mundo, dando origem ao movimento #MeToo.

"Baseado na confiança"

Delahunty disse não acreditar que o assédio sexual seja pior em sua profissão do que em outras, mas as peculiaridades históricas do sistema jurídico inglês podem deixar as pessoas vulneráveis.

"Somos um grupo de indivíduos chamados barristers que são autônomos, que se reúnem em uma série de câmaras e que operam em um ambiente que não é corporativo e que se baseia na confiança", disse.

No sistema jurídico da Inglaterra, o papel do advogado é dividido em dois. Os "barristers" – profissão de Delahunty – debatem nos tribunais, enquanto os "solicitors" oferecem assessoria jurídica em seus escritórios.

Os jovens advogados que se preparam para ser barristers – conhecidos como pupilos – começam acompanhando um advogado sênior, conhecido como supervisor de pupilos.

"Eles se transformam em uma unidade", disse. "Onde um vai, o outro vai atrás."

Essa proximidade pode render amizade e apoio por toda a vida, mas "também pode ser a receita para atenções ou comentários indesejados e inapropriados", o que deixa os jovens advogados indecisos a respeito do que fazer, porque o supervisor tem poder sobre suas carreiras, disse ela.