Topo

Como encontramos em "comuna" de mães e filhos receita para superar divórcio

Janet (ao centro, com Nicola à esq e Vicky à dir) voltou a se casar, mas guarda boas memórias do tempo em que dividiu a casa com as amigas - Janet Hoggard
Janet (ao centro, com Nicola à esq e Vicky à dir) voltou a se casar, mas guarda boas memórias do tempo em que dividiu a casa com as amigas Imagem: Janet Hoggard

Esme Ash

Da BBC

14/10/2018 09h15

A britânica Janet Hoggart era mãe solo, divorciada havia um ano, quando decidiu oferecer um quarto vago na sua casa para sua amiga Vicky e o bebê dela passarem algumas semanas. As semanas viraram anos e evoluíram para uma "comuna de mães", que reuniu três mães e seis crianças.

Elas contam que se ajudaram mutuamente não apenas com a criação dos filhos, mas também a superar o fim de seus relacionamentos.

Veja também

O arranjo se desfez, mas deixou marcas profundas na vida das três mulheres. E como era viver em uma comunidade assim?

"O divórcio foi um período de luto, muito díficil. (...) Quando Vicky se mudou para cá, todo o clima da casa melhorou", conta à BBC Janet, mãe de três crianças, à epoca todas com menos de cinco anos. "Acabei fazendo memórias muito boas, em um período que talvez tivesse sido muito triste."

Vicky tinha uma filha de dez meses e havia acabado de se separar do marido. Sem dinheiro suficiente para arcar com uma casa própria, ela decidiu se abrigar na casa de Janet temporariamente.

As amigas já haviam passado férias juntas e com seus respectivos ex-maridos. Morar na mesma casa, diz Janet, acabou sendo "uma versão estendida das férias".

"Depois de ela ter ficado um tempo aqui em casa, vi que não queria mais que ela fosse embora", conta Janet.

E daí entrou em cena uma terceira mulher: Nicola, que frequentava uma aula de musicalização infantil com elas.

Janet e Vicky perceberam que Nicola também havia acabado de se separar do marido.

Como não havia espaço físico para Nicola se mudar para a casa de Janet, ela passou a frequentar a residência após o horário da escola das crianças e na maioria dos finais de semana.

O trio de mulheres também aproveitava os finais de semana em que as crianças estavam com os respectivos pais para planejar festas e saídas noturnas.

No dia a dia, elas se dividiam com as tarefas da casa, como cozinhar, e com os cuidados com as crianças.

"Quando você passa por situações difíceis, como alguém te abandonar, mesquinhezas cotidianas perdem a importância", afirma Janet.

No primeiro ano, ela não cobrou aluguel de Vicky, para que a amiga pudesse economizar dinheiro para uma casa própria. Em contrapartida, Vicky pagava por uma faxineira duas vezes por semana.

Para Janet, em muitos aspectos acabou sendo mais fácil viver com uma mulher do que com um homem.

"O que vou falar é um estereótipo de gênero, (mas) me casei duas vezes e (acho que) os homens não veem sujeira e bagunça do mesmo jeito que mulheres. Vicky é mais como eu, capaz de ver a sujeira, vemos as coisas do mesmo jeito", conta.

"Às vezes virava uma zona - nós duas adultas, com quatro crianças, mais Nicola e seus dois filhos. Então era caótico, mas mantínhamos o controle da situação porque havia um acordo não verbal entre nós de que manteríamos a casa bem cuidada."

Elas contam que sua comunidade serviu de inspiração para outras amigas em crises conjugais.

"Chegou a ser engraçado: diversas amigas nossas que começavam a se sentir insatisfeitas em seus casamentos pensavam, 'hum, há alternativas, não preciso morrer de tristeza'. Nós nos ajudamos mutuamente a nos reerguer, a não ficarmos sozinhas", diz Janet.

"(Com isso), pessoas vivendo momentos ruins acabaram entrando na nossa vida - vinham tomar um vinho, sentar conosco, comer. Fizemos algumas festas, com um espírito muito inclusivo. Foi uma época muito feliz, muito positiva, de conexão entre mulheres."

O arranjo acabou de forma natural, quando Vicky percebeu que precisava de mais espaço e queria dar à filha Daisy um quarto que fosse só dela.

Janet diz que o período que viveu junto com a amiga mudou sua definição de família.

"Os amigos são as pessoas que escolhemos como família, além das relações de sangue", diz ela. "É também algo fluido, as pessoas entram e saem das nossas vidas por razões diferentes - algumas entram e servem um propósito, outras ficam para sempre."

Para ela, a experiência a ajudou a perceber que seu ex-marido e a família dele (dos quais havia se distanciado a princípio) ainda são parte importante de sua vida.

"A irmã dele veio almoçar comigo recentemente e disse para mim: 'você sempre será minha cunhada'. Me apeguei muito a isso", conta.

Janet hoje mora com seu novo marido. Mas guardou uma lição do período em que viveu com a amiga: de que pessoas que estejam passando por separações devem sempre se ajudar mutuamente.

"Quando você estiver muito, mas muito mal, minha dica é: ajude outra pessoa com algo pela qual ela esteja passando. Automaticamente, ao ajudar alguém, você ajudará a si mesmo. Não é algo que vai distraí-lo da sua própria dor, mas que vai ensiná-lo. Nós todas nos ajudamos muito mutuamente", diz ela.

"Nós não achávamos que (com a comunidade) estávamos fazendo nada de especial, mesmo quando amigas nos dizíamos que éramos incríveis. Estávamos apenas vivendo nossas vidas, não parecia ser nada extraordinário. Agora, olhando para trás, vejo que foi uma atitude muito feminista."